Cesar Fueta
Cesar Fueta
Direito empresarial

O caso Starbucks e a proteção dos segredos empresariais

O recente incidente de vazamento de receitas de bebidas da Starbucks serve como um lembrete importante dessa realidade.

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14 de novembro de 2023
Vinicius Palermo
O caso Starbucks e a proteção dos segredos empresariais
Violação de dados empresariais é crime.

No ambiente empresarial, a confidencialidade é um pilar fundamental para a sustentabilidade e o sucesso dos negócios. O recente incidente de vazamento de receitas de bebidas da Starbucks serve como um lembrete importante dessa realidade. É relevante lembrar que este episódio não é o primeiro incidente de vazamento de segredos empresariais da Starbucks. Desta vez, no entanto, as receitas foram divulgadas no X (antigo twitter). Nessa rede social, um usuário postou as receitas das bebidas da cafeteria e alegou que um ex-funcionário da Starbucks teria sido o suposto responsável pela divulgação. Neste artigo vamos analisar os aspectos trabalhistas deste caso e a importância crucial dos acordos de confidencialidade nas relações de trabalho.

No dia 13 de outubro, as redes sociais foram veículo para divulgação de mais uma vingança digital. Neste caso, em vez de um relacionamento amoroso, a vingança teve origem na relação de trabalho: um ex-funcionário da Starbucks teria divulgado, em retaliação pela sua demissão, todas as receitas secretas da cafeteria. Um usuário da plataforma X (ex-twitter) teve acesso a estes dados e realizou uma postagem com as fotos de diversas receitas da Starbucks. Este post recebeu mais de 18 milhões de visualizações, teve mais de 207 mil curtidas, ultrapassou 6 mil comentários, foi favoritada mais de 235 mil vezes e teve mais de 64 mil compartilhamentos.

O texto da publicação, originalmente em inglês, diz: “Uma funcionária da Starbucks foi demitida, e ela postou todas as receitas das bebidas da Starbucks. De nada”. Dentre os milhares de comentários, destaca-se o seguinte: “Receitas!!! Amantes da Starbucks… este tópico é um presente para todos vocês!! Isso é o que acontece quando você trata seus funcionários mal… paga salários baixos, não oferece benefícios e os penaliza por formar um sindicato!”. Fato é que essa grande repercussão reflete a relevância do modelo de negócio da Starbucks no mercado. Porém, além da curiosidade popular, o vazamento das receitas levanta questões importantes sobre a proteção de segredos comerciais e a conduta dos colaboradores.

No Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê na alínea “g” do artigo 482 que a violação do segredo da empresa constitui motivo para a demissão por justa causa. As receitas de restaurantes, bares e cafeterias, como no caso da Starbucks, são exemplos clássicos de informações sensíveis protegidas pela legislação laboral. A segurança dessas informações no contexto jurídico brasileiro não pode contar única e exclusivamente com essa norma legal que, por si só, não é suficiente para uma proteção efetiva. Além da previsão legal, é essencial um arcabouço contratual que regulamente o tema e aumente a segurança dos empreendedores. Portanto, a questão central aqui é: como os empresários podem fortalecer a proteção dos segredos comerciais de seus negócios nas relações de trabalho?

A resposta a esse questionamento é simples e está no uso efetivo e adequado do acordo de confidencialidade, conhecido também como Non Disclosure Agreement (NDA), termo de sigilo e confidencialidade, ou acordo de não divulgação. O acordo de confidencialidade nada mais é do que um contrato celebrado entre as partes. Por isso, vamos analisar os principais aspectos deste instrumento contratual.

O primeiro aspecto deste contrato é em relação às partes contratantes. O Non Disclosure Agreement é firmado entre a empresa e os colaboradores, sejam aqueles com vínculo de emprego ou os terceirizados.

O segundo aspecto trata da definição dos dados que são protegidos. A descrição das informações que são resguardadas deve ser clara e precisa, e não pode deixar qualquer margem de dúvida acerca de seu conteúdo.

O terceiro elemento do contrato é estabelecer a forma como os segredos são tratados pelos colaboradores. Neste ponto, não se trata apenas de regulamentação da transmissão das informações, mas de todo seu processamento, armazenamento e eliminação dos dados sigilosos.

O quarto ponto que precisa estar regulamentado no Non Disclosure Agreement trata das penalidades em caso de violação da obrigação em manter as informações em segredo, ou seja, na hipótese de vazamento. Embora o contrato de confidencialidade não impeça que um colaborador trabalhe para concorrentes, este instrumento atribui maior segurança às informações e fortalece a preservação dos segredos comerciais.

O quinto e último elemento que destacamos é o prazo de duração da obrigação de manutenção de sigilo. Trata-se de cláusula essencial para que ex-colaboradores não divulguem os segredos aos concorrentes, bem como visa a evitar que se inaugure uma empresa concorrente com base nas informações estratégicas obtidas por ex-colaborador de sua antiga empresa.

Estes são os elementos principais do termo de sigilo e confidencialidade. Outras cláusulas podem e devem ser adicionadas, conforme a especificidade de cada empreendimento. O importante é identificar com precisão quais os segredos empresariais que são divulgados aos colaboradores, quais são as pessoas que têm acesso a essas informações no exercício da atividade empresarial, regulamentar o tratamento destes dados, estabelecer as penalidades e o prazo de duração das obrigações contratuais.

Certo é que o caso da Starbucks não é um incidente isolado e representa um exemplo de um desafio recorrente no mundo empresarial. A disseminação de informações sigilosas, seja por vingança ou descuido, pode ter impactos significativos e prejuízos irreversíveis no competitivo mercado atual. A implementação de termos de confidencialidade torna-se não apenas uma medida de precaução, mas verdadeira estratégia fundamental para resguardar ativos intangíveis essenciais para a empresa.

É relevante que empresários adotem medidas eficazes sobre proteção de informações e reforcem as políticas de confidencialidade, com a consciência de que o sigilo dos segredos empresariais vai muito além da questão tecnológica: trata-se de desafio que envolve gestão de recursos humanos e cultura corporativa.