Cesar Fueta
Cesar Fueta
Direito empresarial

Gerenciando as relações entre o sócio de serviço e investidores

O ponto relevante que precisamos ter em mente é que na sociedade empresária existe uma vedação legal para que o sócio contribua exclusivamente com serviço.

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26 de dezembro de 2023
Gerenciando as relações entre o sócio de serviço e investidores
Foto: Divulgação

É muito comum que a contribuição de um sócio seja exclusivamente por serviços, sem que haja um aporte de capital no início do empreendimento. No entanto, existem alguns pontos que são frequentemente esquecidos pelos empresários. O resultado desta negligência vai desde conflitos societários até o fim do negócio e do relacionamento.

Neste artigo vamos tratar do sócio de serviço na prática, sem adentrarmos profundamente em questões doutrinárias, mas atentos à regulamentação legal dessa parceria. Falaremos dos desafios que a sociedade precisa enfrentar para admitir este tipo de sócio e algumas ferramentas úteis para que o empreendimento tenha o melhor resultado, do início ao fim.

Para facilitar nosso entendimento, vamos pensar no sócio de serviço como aquele que ingressa na sociedade sem um imediato aporte de capital. No começo das atividades empresárias, ele contribui para o sucesso da sociedade exclusivamente por meio de sua mão de obra.

Cabe aos demais sócios a participação inicial por meio de aportes financeiros. Para fins deste artigo, estes sócios serão chamados de sócios investidores. Neste contexto podemos perceber que este tipo de relação societária gera vários desafios e aqui vamos tratar da valorização do trabalho e dos acordos bem definidos.

Quanto à valorização do trabalho do sócio de serviço, existem dificuldades em avaliar adequadamente a contribuição por meio de trabalho em comparação com aquela realizada pelo aporte de capital. Isso pode levar a desequilíbrios percebidos na distribuição de lucros e nas responsabilidades, bem como no encerramento da sociedade. Nos casos em que a contribuição do sócio de serviço não é bem regulamentada, os conflitos internos surgem no decorrer do empreendimento e se agravam na dissolução da sociedade.

No que se refere aos acordos bem definidos, notamos que muitas vezes falta clareza nas expectativas e nas regras do relacionamento entre o sócio de serviço e o sócio investidor. Não é raro que o sócio de serviço se perceba prejudicado por considerar que se tornou um “empregado” do sócio investidor. Do mesmo modo, é comum na dissolução da sociedade que o sócio investidor se sinta injustiçado quando o sócio de serviço recebe parte dos valores apurados no encerramento do empreendimento. Afinal, a ideia é a de que não houve aporte de capital pelo sócio de serviço e, por isso, não haveria valores a serem recebidos no fim da sociedade.

Estes são os problemas mais comuns na sociedade em que há a presença do sócio de serviço. Como podemos atuar para que o empreendimento se desenvolva da melhor forma possível sem que isso gere custos financeiros e desgastes no relacionamento? Como estruturar essa parceria?

O ponto relevante que precisamos ter em mente é que na sociedade empresária existe uma vedação legal para que o sócio contribua exclusivamente com serviço. Portanto, não existe a possibilidade de ingresso de um sócio que contribua apenas com a sua de mão de obra. Todo sócio precisa fazer um aporte de capital.

Como consequência dessa regra legal, o ingresso de qualquer sócio no empreendimento gera a obrigação legal de compartilhar o patrimônio empresarial, mesmo que o sócio de serviço não esteja gerando os resultados esperados. E aqui está um erro grave: muitos empresários procuram superar esta vedação incluindo a informação de um aporte financeiro fictício por parte do sócio de serviço. Esta declaração não verdadeira torna o sócio de serviço dono do patrimônio societário na proporção estabelecida no contrato social e a divisão dos bens da sociedade é inevitável.

A primeira solução prática é estabelecer o montante que o sócio de serviço se compromete a aportar utilizando-se de sua parte do lucro distribuído, bem como o prazo para que este investimento seja realizado. Neste caso, apesar do capital social não estar totalmente integralizado, existe a expressa previsão do valor que o sócio de serviço se comprometeu a alocar na empresa.

Outra ferramenta prática é o empréstimo do sócio investidor para o sócio de serviço. Neste caso, o capital social estará totalmente integralizado com o aporte financeiro realizado pelos sócios. Este empréstimo será regulamentado em outro instrumento jurídico, como um contato de confissão de dívida, em que o sócio de serviço se obriga a devolver os valores ao sócio investidor conforme cronograma predeterminado.

A terceira opção que podemos mencionar é o contrato de vesting. Para o cenário em que temos um sócio de serviço, este sócio adquire uma participação mínima, mas correspondente ao capital que ele possui no momento. Ao mesmo tempo o contrato prevê a possibilidade de que o sócio de serviço aumente gradativamente sua participação societária, desde que alguns requisitos sejam cumpridos, como metas de desempenho.

Vale ressaltar que a atratividade deste tipo de contrato decorre da participação desproporcional nos lucros. Assim, ainda que o sócio de serviço detenha participação societária mínima, as partes podem estabelecer contratualmente o percentual de participação nos lucros de forma diferente da composição societária. Também é viável que esta distribuição dos lucros seja elevada progressivamente, conforme o resultado apresentado pelo sócio de serviço.

Em conclusão, verificamos que o sócio de serviço muitas vezes agrega conhecimento específico e essencial ao desenvolvimento da atividade empresária. Sua participação na sociedade pode ser fundamental e é viável ainda que sem aportes financeiros substanciais ou investimentos iniciais. Por isso, a efetiva regulamentação da parceria entre o sócio de serviço e o sócio investidor é imprescindível para assegurar que o empreendimento se desenvolva com o máximo de segurança possível. Somente assim é possível proteger de forma eficiente o patrimônio e o relacionamento entre os sócios.