Suellen Escariz
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Pelo mundo

O direito, as diferentes culturas e o constitucionalismo global

É interessante observar a evolução na compreensão e aplicação dos direitos fundamentais ao longo do século passado

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12 de abril de 2024
Vinicius Palermo
O direito, as diferentes culturas e o constitucionalismo global
O Constitucionalismo Global seria compreendido pela evolução do direito internacional que se tornaria parâmetro de validade para as constituições nacionais

O renomado jurista português Canotilho afirma que: “O Direito Constitucional no século 21 é um saber em que o cosmos normativo não se encontra fechado sobre si mesmo e em que a rede de teorias clama por uma análise ao nível do constitucionalismo global, além do constitucionalismo nacional, o que evoca a ideia de uma real transnacionalidade do direito”.

A reflexão segue no sentido de vislumbrar uma nova ordem jurídica que compreenda as diferentes culturas e as mais variadas interpretações sobre o que chamamos de “Direitos Fundamentais”, teoricamente o objetivo é garantir maior proteção a direitos inerentes à condição de ser humano, na prática, abre-se muito espaço para ponderações contrárias à efetiva proteção de direitos fundamentais.

Assim, o Constitucionalismo Global seria compreendido pela evolução do direito internacional que se tornaria parâmetro de validade para as constituições nacionais que deveriam estar de acordo com valores supremos, dentre os quais a dignidade da pessoa humana e outros valores mínimos que comporiam um jus cogens internacional.

Nesse contexto, surge também a teoria do Transconstitucionalismo, que é a ideia segundo a qual os ordenamentos jurídicos de vários Estados devem dialogar e ser aplicados em conjunto para a obtenção de soluções práticas de natureza constitucional, tendo como premissa a insuficiência das ordens nacionais ou locais para solucionar complexos problemas de uma sociedade multicêntrica.

As constantes mudanças sociais, e a compreensão de que a cultura ocidental se encontra em alto grau de integração, proporcionam teorias que buscam uma unificação de ordenamentos, ou ainda, um diálogo ativo entre eles na busca de soluções democráticas e justas para as diversas demandas que surgem, nos mais diferentes contextos internacionais.

Uma discussão tem chamado a atenção dos diversos meios de comunicação de todo o mundo, o multinacional empresário Elon Musk e o Ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro Alexandre de Moraes. O conflito em ambiente virtual ultrapassa os já estudados exemplos de questões internacionais que precisam de uma nova visão, nova “roupagem” e interpretação, evidenciando que a rede mundial de computadores consegue transformar o mundo em um palco quase neutro, ressalvadas as nações fechadas, é preciso compreender até onde vai a liberdade e até onde aplica-se o ordenamento jurídico brasileiro.

Musk desafia as determinações judiciais de Alexandre de Moraes em território brasileiro e ameaça entregar supostas provas de ilegalidades cometidas pelo Ministro. Ante à ameaça à soberania nacional, o Estado brasileiro ameaça encerrar contratos de prestação de serviços com as empresas de Musk e ainda, bloquear completamente a rede social X (antigo Twitter) também pertencente ao empresário.

As atuações de ambas as partes fogem à normalidade tanto a nível de relações internacionais entre Estados, quanto no âmbito das relações privadas internacionais, incluídas as multinacionais gigantes.

Os aspectos sociais também vão além das figuras emblemáticas, estão em cheque ainda diversos empregos (funcionários brasileiros de Musk), as atividades econômicas do empresário no Brasil, que influenciam diversos campos da economia e ainda a necessidade de respeito às leis e princípios do Estado Democrático de Direito.

Os próximos acontecimentos trarão clareza acerca da interpretação jurídica, dos limites e da possibilidade de conversação internacional que a demanda exige. Independentemente dos posicionamentos, será valioso compreender a interpretação do Direito Constitucional para uma questão tão atual, inédita e possivelmente, precursora de novas demandas similares, não só no Brasil, mas em diversos países.


Suellen Escariz – Advogada e Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra – Instagram