Suellen Escariz
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Pelo mundo

A polêmica fala do Presidente da República de Portugal

É interessante observar a evolução na compreensão e aplicação dos direitos fundamentais ao longo do século passado

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26 de abril de 2024
Vinicius Palermo
A polêmica fala do Presidente da República de Portugal
Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República de Portugal

Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República de Portugal, já conhecido nos noticiários brasileiros, aparece outra vez com uma declaração polêmica.

Marcelo declarou que Portugal tem responsabilidade sobre crimes da era colonial, como tráfico de pessoas na África, massacres a indígenas e bens saqueados. O Chefe de Estado afirmou que Portugal foi responsável por uma série de crimes contra escravos e indígenas no Brasil na era colonial e deve pagar por isso.

O presidente sugeriu ainda que Portugal faça reparações pela escravidão e afirmou que seu país “assume total responsabilidade pelos danos causados”, como massacres a indígenas, a escravidão de milhões de africanos e bens saqueados.

Até pouco tempo, era comum ouvir entre brasileiros e portugueses algumas reações no sentido de que Portugal “havia roubado o ouro do Brasil”. O que até então seguia em tom de “brincadeira” na internet, ganhou maior proporção quando o Ministro do STF Flávio Dino, à época Ministro da Justiça, após um episódio de xenofobia praticado por uma portuguesa contra uma brasileira em Portugal, afirmou que “os brasileiros deveriam invadir Portugal, como um direito à reciprocidade”, em alusão à colonização nos idos 1500.

A notícia caiu mal para os cidadãos portugueses que não viram com bons olhos a fala de um Ministro de Estado, mas parece que o Presidente da República de Portugal, em algum grau, concorda.

É a primeira vez que um presidente de Portugal afirma a existência de culpa. Em 2023, Marcelo havia dito que Portugal deveria se desculpar pela escravidão transatlântica e pelo colonialismo, mas não chegou a pedir desculpas completas.

Essa semana, próximo ao dia 25 de abril, uma data emblemática para os portugueses, data que simboliza o fim das guerras coloniais e da ditadura em Portugal (25/04/1974), tal afirmação cai ainda pior.

Vale lembrar que um possível acerto de contas vai sobrar para os cidadãos de hoje, que nada fizeram para corroborar aos acontecimentos históricos, e que, assim como grande parte de brasileiros e africanos envolvidos nos acontecimentos, também colhem frutos amargos do período.

Há tempos que a era colonial de Portugal – durante a qual países como Angola, Moçambique, Brasil, Cabo Verde e Timor Leste, além de partes da Índia, foram submetidos ao domínio português – não é lembrada como uma fonte de orgulho, entretanto, muito se esquece o que também foi feito de bom pelos portugueses e mais, os cidadãos que também foram obrigados a sofrer os malefícios da guerra, perdendo familiares e oportunidades para o sistema, vislumbram agora uma possível piora nas  condições de vida, já deterioradas no que toca à inflação e no serviço nacional de saúde, por exemplo, em prol de acontecimentos históricos.

Portugal tem uma lei de nacionalidade extremamente benéfica a descendentes de portugueses, tem acordos nas mais diversas áreas que beneficiam cidadãos originários de países que falam a língua portuguesa, especialmente com o Brasil.

É um pouco difícil imaginar como Marcelo ou seu futuro sucessor pretendem estabelecer a tão falada reparação. O futuro dirá.


Suellen Escariz – Advogada e Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra – Instagram