Cesar Fueta
Cesar Fueta
Direito empresarial

Superando os impasses nas sociedades limitadas

No cenário empresarial contemporâneo, a escolha pela constituição de sociedades limitadas com participação paritária de 50% para cada sócio revela-se uma prática muito comum.

Compartilhe:
04 de março de 2024
Vinicius Palermo
Superando os impasses nas sociedades limitadas
O principal tema que envolve a divisão equânime da sociedade reside na dinâmica de tomada de decisões.

No cenário empresarial contemporâneo, a escolha pela constituição de sociedades limitadas com participação paritária de 50% para cada sócio revela-se uma prática muito comum. Essa forma de divisão societária reflete uma percepção da imensa maioria dos empreendedores: a de que essa estrutura, por si só, garante uma relação societária com equilíbrio de poder e controle dentro da gestão empresarial.

Observamos, ainda, que tal estrutura é frequentemente preferida por empreendedores que almejam iniciar seus negócios sob uma ótica de igualdade, evitando uma posição minoritária que poderia, em tese, colocar em risco a sua influência nas decisões críticas da empresa. Essa visão é profundamente equivocada. O panorama aparentemente confortável que surge com a divisão igualitária das cotas sociais esconde armadilhas e desafios inerentes às complexas relações empresariais.

Na ausência de um planejamento estratégico e de uma orientação jurídica adequada e preventiva, o empreendedor se vê preso a problemas sem solução, submete-se a grandes riscos que poderiam ser administrados com efetividade se tratados com antecedência, e não consegue se proteger de consequências drásticas, como a dissolução da sociedade. No presente artigo, pretendemos demonstrar os desafios existentes nas sociedades limitadas cujo capital social é dividido de forma igualitária entre dois sócios e algumas ferramentas que auxiliam o empresário nessas empresas.

O principal tema que envolve a divisão equânime da sociedade reside na dinâmica de tomada de decisões. O desenvolvimento de qualquer atividade empresarial exige decisões cada vez mais rápidas para lidar com um mercado em constante mudança. Nesse sentido, qualquer fricção nas deliberações sociais pode acarretar prejuízos para a empresa se não forem solucionados de forma prontamente. Portanto, em situações de impasse decisório, a falta de um mecanismo de resolução claramente definido no contrato social da empresa pode levar a um estado de paralisia operacional.

Destacamos, ainda, dependendo das disposições do contrato social, um empate em votações pode resultar na aprovação ou na rejeição de uma deliberação. E esse detalhe de crucial importância pode estar imperceptível numa cláusula que não trata expressamente de deliberações e de votações, mas sim naquela que indica qual é a lei aplicável no caso de omissão do contrato social. Não precisamos entrar nas minúcias dessa regência supletiva ou subsidiária. Afinal, o que queremos evidenciar aqui é a importância crucial de um contrato social bem elaborado, alinhado aos interesses e às expectativas dos sócios.

A verdade é que as desavenças significativas entre sócios em uma sociedade paritária frequentemente culminam numa solução que não foi aquela pretendida pelos sócios: a dissolução da empresa. Trata-se de um triste desfecho que poderia ser evitado com a implementação de estratégias de planejamento pré-constituição, com ferramentas simples e eficientes.

É comum notar que a dissolução da empresa muitas vezes surge após tentativas frustradas de resolver o impasse. Isso acontece porque os sócios ficam vinculados a contratos sociais não elaborados especificamente para o empreendimento e as ferramentas existentes são insuficientes para lidar com o problema. Os esforços infrutíferos envolvem a venda de participações a terceiros, a tentativa de exclusão de um sócio por falta grave e as limitações do papel do sócio administrador em decisões estratégicas. Essas abordagens carecem de eficácia prática numa sociedade limitada composta por dois sócios com participações societárias igualitárias. Tudo isso contribui para a conscientização de que precisamos de alternativas mais eficazes.

As soluções para evitar que os impasses criem dilemas intransponíveis existem e são mecanismos projetados para superar esses obstáculos e inseridos dentro do contrato social. Entre as ferramentas disponíveis, podemos citar a cláusula de buy or sell, o voto qualificado e o procedimento assistido de solução. Tais ferramentas oferecem caminhos viáveis para a resolução de conflitos, permitindo a continuidade das operações empresariais mesmo diante de divergências significativas.

A cláusula de buy or sell estabelece um procedimento de oferta e contraoferta entre os sócios em caso de desacordo relevante, baseando-se em uma valuation pré-determinada da empresa. O resultado prático é a retirada de um dos sócios em decorrência da venda “forçada” da sua participação societária para o outro sócio. O voto qualificado, por sua vez, funciona como um “voto de minerva” e permite que a decisão de um sócio prevaleça em determinadas situações e assuntos específicos, de acordo com critérios estabelecidos previamente no contrato. Podemos destacar, ainda, o Procedimento Assistido de Solução, uma inovação proposta pelo Professor Pablo Gonçalves e Arruda, que introduz a figura de um mediador escolhido pelos sócios para sugerir uma solução que será adotada obrigatoriamente por ambas as partes.

A escolha por uma sociedade limitada com participação de 50% para cada sócio, portanto, não deve ser feita de maneira precipitada. É preciso um entendimento profundo das implicações legais e operacionais, bem como um comprometimento com a elaboração de um contrato social que contemple mecanismos eficazes de resolução de conflitos. Afinal, o sucesso e a longevidade de uma empreitada empresarial dependem não apenas do trabalho incansável dos sócios e da contribuição de seus colaboradores, mas também da robustez das estruturas jurídicas e administrativas que suportam suas operações.