Suellen Escariz
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Pelo mundo

Primeiro-ministro português pede demissão

O pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-ministro Antônio Costa causou misto de surpresa, felicidade e preocupação.

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09 de novembro de 2023
Vinicius Palermo
Primeiro-ministro português pede demissão
O agora ex-primeiro ministro de Portugal, Antonio Costa.

A semana política começou movimentada em Portugal. O pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-ministro Antônio Costa causou surpresa em alguns, felicidade em outros, e preocupação para mais alguns.

O primeiro-ministro apresentou a demissão ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que a aceitou. A decisão surge na sequência das buscas efetuadas pelo Ministério Público à residência oficial do primeiro-ministro e a ministérios envolvidos em negócios de exploração de lítio em Montalegre, cidade portuguesa.

“A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com a suspeita de qualquer ato criminal. Obviamente apresentei a demissão ao senhor Presidente da República”, disse António Costa. “Quero dizer olhos nos olhos que não me pesa na consciência qualquer ato ilícito. Confio na Justiça”, acrescentou.

Portugal adota o sistema de governo do semipresidencialismo, existindo quatro órgãos de soberania: o Presidente da República; Assembleia da República (parlamento unicameral – diferente do Brasil que é um congresso bicameral com a Câmara dos Deputados e o Senado Federal); o Governo e os Tribunais.

Por isso, em Portugal, o papel do Presidente da República é só de Chefe de Estado, e ao Primeiro-Ministro cabe a função de Chefe de Governo, enquanto que no Brasil, as duas funções são atribuídas ao Presidente da República.

Assim, o Presidente da República em Portugal é eleito por sufrágio universal para um mandato de cinco anos. Este exerce uma função de fiscalização sobre a atividade do Governo, sendo quem nomeia o Primeiro-Ministro e os membros do Governo, tendo, da mesma forma, o poder de demitir o Governo e exonerar o Primeiro-Ministro e outros membros do Governo.

Já o Primeiro-Ministro é o chefe do Poder Executivo, coordenando a ação dos ministros, representando o Governo junto aos outros órgãos de soberania, prestando contas à Assembleia da República e mantendo o Presidente da República informado. O primeiro-ministro pode acumular a função de chefe do Governo com as pastas de um ou mais ministérios.

Antônio Costa afirmou que a demissão foi aceita, mas que se manterá nas funções até que o substituto seja escolhido. Em seu discurso, afirmou estar surpreso ao saber que foi instaurado um processo-crime contra si, e que não sabe do que está sendo acusado, afirmando estar disponível para colaborar com as investigações.

O até aqui chefe de Governo deixou claro que não vai se candidatar nas próximas eleições por respeito ao tempo da Justiça. Naquele que foi encarado como o seu discurso de despedida, agradeceu aos portugueses “pela confiança depositada ao longo dos últimos anos” e à sua família e afirmou: “Esta é uma etapa da vida que se encerra e que encerro com a cabeça erguida, a consciência tranquila e a mesma determinação: servir Portugal e portugueses da mesma forma como no dia em que entrei para primeiro-ministro.”

Pouco depois do discurso, a Presidência da República confirmou em comunicado que a demissão do até aqui primeiro-ministro foi aceita e que Marcelo Rebelo de Sousa decidiu convocar os partidos e o Conselho de Estado no Palácio de Belém e que falará ao país depois da reunião.

Os próximos passos podem ser no sentido de escolher um novo Primeiro-ministro, conforme indicação do Partido Socialista (partido de Antônio Costa, que tem a maioria absoluta na Assembleia da República) ou ainda, convocar novas eleições para a Assembleia da República.

Entretanto, as investigações seguem pelo Supremo Tribunal da Justiça, tribunal competente por se tratar de uma alta figura do Estado, a investigação alcança ainda outros Membros do Governo (ministros de Estado) e empresários envolvidos em um processo que investiga negócios relacionados com a exploração de lítio em Montalegre. (O Ministro das Infraestruturas, João Galamba, foi constituído arguido no processo juntamente com o presidente do conselho diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente.

Em causa está o negócio que garantiu à Lusorecursos a exploração da mina de lítio em Montalegre, apesar de a empresa não fazer parte do grupo de empresas com direito de prospecção. O processo envolve suspeitas de corrupção para beneficiar a Lusorecursos no processo de atribuição da exploração da mina.

Neste âmbito, cinco pessoas foram detidas, entre as quais o empresário Diogo Lacerda Machado, que se apresenta publicamente como um amigo de Antônio Costa – na comissão parlamentar de inquérito à TAP, em maio deste ano, disse preservar uma “excelente amizade” com o primeiro-ministro.

Também o chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, e o presidente da Câmara Municipal de Sines, o socialista Nuno Mascarenhas, foram detidos no âmbito do processo que investiga negócios de hidrogénio e lítio. Dois empresários da zona de Sines também foram alvo de detenções, nomeadamente o CEO da empresa Start Campus, Afonso Salema, e o diretor Jurídico e de Sustentabilidade, Rui Oliveira Neves.


Suellen Escariz – Advogada e Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra – Instagram