Fernanda Valadares
Fernanda Valadares
Planejamento Familiar

O uso da Previdência Privada no Planejamento Patrimonial e Sucessório

O planejamento patrimonial e sucessório é uma prática essencial para assegurar que os objetivos de uma família sejam atingidos de maneira lícita e eficiente.

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11 de junho de 2024
Vinicius Palermo
O uso da Previdência Privada no Planejamento Patrimonial e Sucessório
Existem diversas estratégias que podem ser adotadas, dependendo das metas específicas de cada um.

O planejamento patrimonial e sucessório é uma prática essencial para assegurar que os objetivos de uma família sejam atingidos de maneira lícita e eficiente. Existem diversas estratégias que podem ser adotadas, dependendo das metas específicas de cada um. Entre essas metas, podemos destacar a proteção patrimonial, a facilitação do processo de inventário, a economia tributária, a simplificação da sucessão ou a garantia de que os herdeiros recebam um montante isento de impostos. Dentro deste contexto, muitas famílias optam pela previdência privada como uma forma de planejamento para recebimento rápido de valores pelos herdeiros e, principalmente, com custo reduzido de pagamento de impostos.

Uma das opções mais comuns neste cenário é o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), um plano de previdência privada que possui natureza jurídica de seguro de vida e, portanto, está isento de tributação, ITCMD e do inventário para transferência aos herdeiros, conforme previsto no art. 794 do Código Civil de 2002. Essa característica torna o VGBL uma ferramenta atrativa para aqueles que desejam proteger a sua renda e facilitar a sucessão.

No entanto, antes de aprofundar nas especificidades do VGBL, é importante distingui-lo do outro tipo de plano de previdência privada existente no mercado, o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL). O PGBL é uma modalidade de previdência complementar voltada principalmente para a acumulação de recursos com benefícios fiscais durante o período de contribuição, sendo considerado uma forma de investimento. Já o VGBL é predominantemente utilizado como um plano de previdência complementar aberta, acessível a qualquer pessoa, diferentemente dos planos restritos a grupos específicos vinculados a fundos de pensão fechado, mas também é utilizado  tecnicamente como um seguro de vida com cobertura.

Desta forma, o VGBL, em sua essência, é projetado para funcionar como um seguro de vida. Contudo, há uma discussão na jurisprudência sobre sua utilização, especialmente em casos de falecimento do contratante. A questão central é se o VGBL pode ser usado para burlar direitos sucessórios ao ser destinado a beneficiários específicos, levantando dúvidas sobre sua verdadeira natureza: seguro de vida ou investimento?

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se pronunciado sobre esta questão. Em várias decisões, o STJ tem considerado as circunstâncias específicas de cada caso na hora da contratação e dos aportes feitos no plano para determinar sua natureza jurídica, se seguro de vida ou investimento. Se for comprovado que o VGBL foi utilizado como um mero instrumento de investimento, ele pode ser incluído no monte hereditário e, consequentemente, estar sujeito ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

Dito isso, a jurisprudência do STJ, exemplificada pelo REsp 2.004.210 SP, tem estabelecido que o VGBL, se considerado investimento, pode integrar o patrimônio hereditário e, portanto, deve ser trazido à colação. Este entendimento depende da análise das circunstâncias específicas de cada caso, incluindo o momento e a forma de utilização dos recursos do VGBL.

A regra geral é que o VGBL possui uma natureza securitária e previdenciária complementar. Esta natureza se evidencia quando o titular começa a receber os valores acumulados. No entanto, durante o período de acumulação, o VGBL pode ser caracterizado como uma forma de burlar o inventário e ser utilizado como investimento, especialmente se houver múltiplas possibilidades de depósitos, aportes diferenciados e retiradas antecipadas. Nesses casos, o VGBL pode ser equiparado a outras aplicações financeiras, desta forma, em situações excepcionais, o VGBL deverá ser incluído no patrimônio do falecido e trazidos à colação no inventário, sendo objeto de partilha antes mesmo da conversão em renda e pensionamento do titular.

O STJ também tem considerado circunstâncias especiais ao decidir sobre a natureza do VGBL. Fatores como a idade e a condição de saúde do titular, assim como o uso de valores provenientes da venda do único imóvel da família, podem indicar a condição de investimento do VGBL. Nestes casos, a inclusão do VGBL no patrimônio hereditário se torna ainda mais justificada.

Portanto, o planejamento patrimonial e sucessório através da previdência privada, especialmente utilizando planos como o VGBL, pode ser uma ferramenta poderosa e eficiente. No entanto, é crucial que as famílias estejam cientes das nuances jurídicas e das interpretações judiciais que podem afetar o tratamento desses planos. A jurisprudência do STJ tem mostrado que a utilização do VGBL como seguro de vida ou investimento pode ter implicações significativas na sucessão e no pagamento de impostos.

Concluímos que utilizar o VGBL como seguro de vida puro é um ótimo instrumento de planejamento, no entanto, se consideramos que a sua utilização como investimento para fins de burlar o inventário, seria um tiro no pé no sentido de que a sua discussão sobre a sua natureza jurídica atrasaria em muito o recebimento de eventual dinheiro pelos herdeiros.

Portanto, ao considerar o uso de VGBL ou PGBL no planejamento sucessório, é recomendável consultar um especialista em sucessões para assegurar que os objetivos sejam alcançados de forma legal e que se evitem surpresas desagradáveis durante o processo de inventário. A orientação profissional é essencial para navegar pelas complexidades do direito sucessório e garantir que o patrimônio familiar seja protegido e transferido de acordo com as intenções dos titulares.