Ao ser aberta a sucessão, quando o autor da herança falece, automaticamente a herança passa para os herdeiros. Este fenômeno é conhecido como princípio de saisine, que determina que, no momento do falecimento, a propriedade e os direitos do falecido são transmitidos imediatamente aos seus herdeiros. Contudo, para que essa transferência seja regularizada e efetivamente implementada, é necessário passar pelo processo de inventário.
O inventário é um procedimento jurídico que visa identificar, avaliar e dividir os bens do falecido entre os herdeiros legítimos e testamentários. No entanto, várias questões podem surgir durante este processo. Um exemplo é o que acontece quando um dos herdeiros não foi incluído no processo de inventário. Isso pode ocorrer por diversos motivos, como o desconhecimento da existência de tal herdeiro, seja porque ele não sabia que o falecido era seu pai, ou porque, mesmo sabendo, não havia um reconhecimento oficial de paternidade que pudesse validar seu direito à herança.
Diante dessas questões, uma pergunta surge: qual é o prazo para que um suposto herdeiro entre com uma petição para também requerer seu direito à herança?
A resposta a essa pergunta envolve a compreensão de dois pontos legais importantes: a imprescritibilidade do pedido de reconhecimento de paternidade e o prazo de prescrição para a petição de herança. O reconhecimento de paternidade é imprescritível, o que significa que não há um prazo máximo para que uma pessoa busque o reconhecimento legal de seu vínculo parental. Porém, o mesmo não se aplica ao direito de herança. Há um prazo prescricional específico para que um suposto herdeiro reivindique sua parte da herança.
Historicamente, houve muita discussão nos tribunais sobre quando este prazo de prescrição começa a correr. Alguns entendiam que o prazo de 10 anos para a petição de herança deveria ser contado a partir do trânsito em julgado da ação de paternidade, ou seja, quando o reconhecimento de paternidade se tornasse definitivo iniciaria o prazo de 10 anos para o herdeiro requerer seu direito à herança. Outros defendiam que esse prazo deveria ser contado a partir do falecimento do autor da herança, ou seja, da abertura da sucessão.
Para acabar com a discussão, recentemente, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que o prazo para que uma pessoa entre na Justiça pedindo sua parte na herança começa a contar a partir da abertura da sucessão — ou seja, na data da morte do suposto pai — e não no dia em que foi concluído o processo que reconheceu a pessoa como filha do falecido. Esta decisão é de grande relevância, pois traz maior segurança aos herdeiros que já receberam sua parte da herança, eliminando a incerteza de possíveis reivindicações futuras por prazos superiores há 10 anos, por outros supostos filhos não reconhecidos no momento do falecimento e que não requereram seu direito em tempo hábil.
A decisão do STJ está alinhada com a proposta de alteração do novo Código Civil, que visa incluir de forma expressa no texto legal o início do prazo de prescrição para a petição de herança a partir da abertura da sucessão. Enquanto a alteração legislativa não é implementada, a decisão do STJ serve como orientação e está sendo aplicada pelos tribunais, proporcionando maior segurança jurídica nas questões de herança.
Para os herdeiros, essa decisão significa que, ao receberem sua parte da herança, eles não ficarão indefinidamente à mercê de possíveis novas reivindicações após passar o prazo de 10 anos de prescrição. A contagem do prazo prescricional a partir do falecimento do autor da herança estabelece um limite temporal claro para a estabilidade das relações jurídicas envolvendo o patrimônio herdado.
Em resumo, o princípio de saisine assegura a transferência imediata dos bens do falecido aos herdeiros, mas a regularização dessa transferência depende do inventário. A exclusão de um suposto herdeiro do inventário levanta questões complexas sobre prazos e direitos, que foram recentemente esclarecidas pelo STJ. Agora, fica estabelecido que o prazo para requerer a herança começa na data do falecimento, proporcionando maior segurança e previsibilidade para todos os envolvidos no processo sucessório.
Essa decisão do STJ, além de esclarecer a legislação vigente, reafirma a importância do planejamento sucessório e do reconhecimento legal de vínculos familiares em vida, evitando assim futuras disputas e garantindo que todos os herdeiros legítimos possam exercer seus direitos de maneira clara e eficiente. Para advogados e operadores do direito, essa jurisprudência é um marco importante, que reforça a necessidade de uma atuação diligente e informada na orientação dos clientes em questões sucessórias.