Cesar Fueta
Cesar Fueta
Direito empresarial

Gerenciando riscos trabalhistas na terceirização

Neste artigo, pretendemos elucidar aspectos cruciais que os empreendedores devem monitorar atentamente para gerir essa modalidade.

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16 de janeiro de 2024
Vinicius Palermo
Gerenciando riscos trabalhistas na terceirização
O gerenciamento eficiente da terceirização exige atenção especial a alguns itens que visa a evitar o surgimento e a responsabilização por débitos trabalhistas.

É muito comum no dia a dia jurídico constatarmos a quebra de pequenas e médias empresas por dívidas trabalhistas. Observamos, também, que muitas dessas dívidas sequer eram da própria empresa, mas sim de uma terceirizada. A contratação de uma pessoa jurídica para exercer as atividades da empresa – a terceirização – é uma estratégia amplamente utilizada e autorizada no ordenamento jurídico brasileiro. No entanto, é necessário que se atente para os riscos envolvidos nesse tipo de contratação. Neste artigo, pretendemos elucidar aspectos cruciais que os empreendedores devem monitorar atentamente para gerir os riscos trabalhistas da terceirização com eficiência e, assim, evitar que as dívidas laborais possam comprometer a viabilidade de uma empresa.

O gerenciamento eficiente da terceirização exige atenção especial a alguns itens que visa a evitar o surgimento e a responsabilização por débitos trabalhistas. Estas dívidas podem surgir de duas formas: pela caracterização de vínculo empregatício diretamente entre contratante e contratada, ou pela responsabilização da contratante pelos débitos trabalhistas dos empregados da contratada.

Considerando a fonte das dívidas trabalhistas na terceirização, o primeiro ponto crucial que destacamos é a necessidade de afastar o requisito da pessoalidade, típico das relações de emprego. A pessoalidade se caracteriza pelo fato de que somente aquele trabalhador específico é quem poderá realizar as atividades para a qual foi contratada. Logo, para que este requisito seja afastado é importante que seja contratada uma pessoa jurídica, e não uma pessoa física. E, ainda assim, é preferível evitar a contratação de microempreendedores individuais (MEI), porque normalmente o único sócio é o próprio prestador de serviço, o que pode tornar muito fácil qualquer narrativa de pessoalidade na contratação.

Portanto, entre terceirizar as atividades para um Microempreendedor Individual (MEI) ou para uma sociedade limitada, ainda que unipessoal, esta segunda opção é mais segura. A sociedade limitada oferece uma estrutura que permite a contratação de vários funcionários para a prestação do serviço, fortalecendo a ideia da inexistência de vínculo. Já o Microempreendedor Individual (MEI) pode ter apenas um único colaborador, o que atrai a pessoalidade em sua contratação.

A autonomia e a independência na prestação dos serviços é outro aspecto que precisa ser garantido nos contratos de terceirização. É necessário que exista a possibilidade de substituição do prestador de serviço, permitindo que o contratado possa indicar outra pessoa para realizar o serviço em seu lugar, ou decidir não trabalhar em determinado dia. Essa flexibilidade é um indicativo importante da não existência de vínculo empregatício. A ideia aqui é que o contrato indique quais metas devem ser alcançadas, condicionando o pagamento a resultados, e não a horas trabalhadas. A ausência de estipulação de carga horária mínima e a remuneração baseada em projetos concluídos ou resultados alcançados são aspectos fundamentais para que o risco trabalhista seja mitigado com eficiência.

As ordens diretas que caracterizem subordinação devem ser evitadas. Contudo, isso não impede a existência de padrões ou diretrizes gerais para a execução dos serviços, desde que não configurem controle direto sobre o modo de trabalho do contratado.

O contrato deve, ainda, detalhar o objeto de forma precisa, descrevendo todas as atividades envolvidas. A definição clara do escopo do trabalho é essencial para determinar a independência do contratado na execução das tarefas. Além disso, é importante que o contrato estipule que o prestador de serviço execute suas atividades de maneira independente, sem exigência de exclusividade e sem controle de jornada diária. O contratado deve arcar com todos os custos necessários à prestação dos serviços e utilizar seus próprios equipamentos, evidenciando sua autonomia operacional e financeira.

Sempre que possível, o pagamento do contratado deve ser preferencialmente em forma de comissão, distanciando-se do conceito de salário. Isso porque a comissão alinha-se mais com a lógica de prestação de serviços autônoma e reforça a independência do contratado.

Ainda em relação ao pagamento, o contrato deve conter cláusula expressa que responsabiliza o contratado por qualquer débito trabalhista ou previdenciário oriundo de sua equipe, garantindo que, em caso de processos judiciais em que a contratante seja responsabilizada, haverá reembolso imediato e integral por parte do contratado. Recomenda-se, nesse ponto, incluir previsão contratual de que o pagamento das faturas pela prestação de serviços será condicionado à prova da regularidade trabalhista e previdenciária do contratado. É uma forma de garantir e fiscalizar que a contratada não está gerando débitos trabalhistas que, no futuro, podem vir a ser cobradas da contratante.

Estes são os principais itens de monitoramento em contratos de terceirização quando o tema é gerenciamento de risco trabalhista. Lembramos, porém, que apesar de todas as precauções e previsões contratuais, na prática, se houver elementos que caracterizem uma relação de emprego, como subordinação, habitualidade, pessoalidade e remuneração, isso pode gerar a condenação em verbas trabalhistas. Apesar de óbvio, convém lembrar que todo e qualquer contrato precisa refletir a verdade da relação entre as partes, e isso é mais evidente ainda no âmbito laboral. Afinal, para o Direito do Trabalho, a realidade dos fatos e das interações diárias de como o trabalho é executado são os fatores que definem a caracterização de uma relação de emprego. A realidade factual das relações estabelecidas sempre vai prevalecer sobre o conteúdo formal do contrato.

Diante de tudo que foi ressaltado, podemos concluir que a gestão eficaz da terceirização requer não apenas cláusulas bem redigidas e detalhadas, mas também uma operacionalização que reflita a independência e autonomia do contratado. O alinhamento entre a realidade prática e o conteúdo do contrato é primordial para assegurar a natureza jurídica pretendida da relação e evitar o reconhecimento de vínculo empregatício.