Cesar Fueta
Cesar Fueta
Direito empresarial

Uma breve análise sobre conflitos frequentes nas limitadas

A constituição de uma sociedade limitada envolve diversos aspectos jurídicos que podem arruinar o empreendimento se não tratados previamente.

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18 de junho de 2024
Vinicius Palermo
Uma breve análise sobre conflitos frequentes nas limitadas
O patrimônio de uma empresa Sociedade Limitada é dividido em cotas.

A constituição de uma sociedade limitada envolve diversos aspectos jurídicos que podem arruinar o empreendimento se não tratados previamente. São pontos simples e, frequentemente, negligenciados pelos empresários, mas quando se tornam objeto de controvérsia, costumam gerar graves prejuízos à empresa e desgaste entre os sócios. Neste artigo, falaremos sobre os desafios envolvendo a divisão do poder, a divisão de trabalho e de dinheiro, e o ingresso de estranhos nas limitadas. Trataremos também de algumas ferramentas úteis para que os empresários cuidem destes temas de forma eficaz.

A divisão do poder na sociedade limitada é o primeiro ponto de atenção para os empresários, porque é comum o receio em possuir uma participação minoritária no empreendimento. É comum a percepção (equivocada) de que falta influência nas decisões da empresa e a de que o minoritário fica vulnerável, podendo ser expulso a qualquer momento da sociedade.

De início, é relevante compreendermos a estrutura básica de uma sociedade limitada. O patrimônio de uma empresa desse tipo é dividido em cotas. Cada real investido pelos sócios corresponde a uma cota, determinando assim a participação de cada um no capital social da empresa. Isso é bastante simples quando todos investem partes iguais. As coisas costumam se complicar quando os investimentos são desiguais. O Código Civil determina que os sócios majoritários, aqueles que fizeram o maior aporte financeiro na sociedade, têm maior poder decisório dentro da empresa. Vale lembrar que ser sócio minoritário não é, por si só, um problema. Sócios minoritários têm o direito de participar das decisões da empresa, de votar nas assembleias e de permanecer na sociedade, desde que não cometam faltas graves. A preocupação de ser expulso sem motivo válido é infundada, pois a lei protege os sócios minoritários contra abusos.

Além disso, é importante destacar que o aporte financeiro numa sociedade nem sempre pode representar o aumento na participação societária. Por meio de acordos entre os sócios, se um deles decide realizar novo investimento, esse valor pode ser tratado como um empréstimo em vez de aumento na participação societária. E isso não representa um problema. Investir numa empresa é sempre um risco. Se a empresa for bem-sucedida, os lucros ou o aumento do patrimônio compensam o investimento inicial. Porém, se a empresa falhar, o dinheiro investido pode ser perdido. Já os valores contabilizados como empréstimos não correm esse risco, pois a empresa tem a obrigação de devolvê-los ao sócio.

Outro tópico que costuma gerar conflitos quando não tratado previamente é a divisão de trabalho e de dinheiro nas sociedades limitadas.

A principal obrigação dos sócios na limitada é o investimento financeiro. Neste ponto, a lei estabelece que os sócios que não investem financeiramente podem ser excluídos da sociedade como sócios remissos. O Código Civil não permite que a participação em uma sociedade limitada empresária seja realizada apenas por trabalho. Assim, qualquer sócio que não tenha capital para investir precisa negociar com os demais a possibilidade de pagar sua participação futura com os lucros obtidos, mas jamais ingressar na sociedade com a mera promessa de trabalho.

Uma solução viável para trazer um sócio que possui habilidades essenciais sem capital para investir, é o uso do vesting. Este instrumento permite que a sociedade teste o trabalho de um potencial sócio antes de conceder a ele uma participação societária. Esse mecanismo é útil para o ingresso de um especialista no empreendimento, estabelecendo metas específicas antes de se tornar sócio.

Os acordos de sócios são ferramentas essenciais nessa dinâmica trabalho-investimento. Esses acordos, paralelos ao contrato social, devem estipular claramente as obrigações de cada sócio em relação ao investimento e ao trabalho. Tais documentos devem incluir cláusulas que tratem das responsabilidades de trabalho e entrega de resultados. Sem esses acordos, é muito comum que os sócios se sintam injustiçados.

Um ponto importante a ser considerado é que, embora investir financeiramente seja uma obrigação do sócio na limitada, trabalhar não é. Sócios não são automaticamente obrigados a trabalhar na sociedade a menos que isso esteja claramente estipulado. Isso pode levar a situações em que um sócio se sinta sobrecarregado e injustiçado por estar realizando todo o trabalho enquanto os outros não contribuem operacionalmente.

Para evitar conflitos, a instituição de um prolabore é primordial, definindo-se uma remuneração pelo trabalho realizado. Convém mencionarmos que o prolabore não se confunde com o lucro, que visa a remunerar o investimento. Essa separação ajuda a manter o equilíbrio entre os sócios que contribuem financeiramente e aqueles que também contribuem com trabalho.

Por fim, vamos tratar do ingresso de estranhos em sociedades limitadas. Este tipo de sociedade é construído sobre um vínculo de confiança entre os sócios. A entrada de pessoas estranhas ao empreendimento quase sempre compromete a harmonia interna da sociedade, o que poderia ser evitado com a elaboração de instrumentos jurídicos específicos para o modelo de negócio dos sócios.

Na limitada, a venda de participação societária para terceiros é, em regra, restrita. O Código Civil exige que não haja oposição de titulares de mais de um quarto do capital social. Isso significa que um sócio, mesmo com uma participação significativa, não pode simplesmente vender sua parte a um estranho sem o consentimento dos demais sócios. Muitos empresários ignoram essa regra fundamental do Código Civil, elaboram contratos sociais genéricos, o que gera tentativas de venda inválidas, resultando em conflitos que poderiam ter sido evitados. No entanto, a legislação oferece uma saída: o sócio pode exercer seu direito de retirada e a sociedade é obrigada a pagar seus haveres.

Os haveres representam o acerto de contas entre a sociedade e o sócio que está saindo. Esse valor é calculado com base no patrimônio da empresa e pode ser mais alto ou mais baixo do que o investimento inicial do sócio. Para evitar desentendimentos, é fundamental que a forma de cálculo dos haveres esteja claramente estipulada antecipadamente. A falta de um acordo detalhado pode levar a avaliações injustas e a graves divergências.

Portanto, a constituição de uma limitada exige planejamento cuidadoso e definições claras de obrigações e direitos dos sócios. A divisão de poder dentro da sociedade, a definição do trabalho e da remuneração, bem como o ingresso de novos sócios são alguns dos temas sensíveis que merecem acordos detalhados para evitar conflitos prejudiciais à empresa e, em alguns casos, até mesmo fatais para o empreendimento. Afinal, como visto, prevenir desavenças e estabelecer antecipadamente regras claras e objetivas são primordiais para a longevidade de qualquer negócio.