Cesar Fueta
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Direito empresarial

A Europa na Vanguarda: AI Act e a Regulamentação da Inteligência Artificial

A velocidade da evolução tecnológica representa um grande desafio para o Direito, principalmente no que se refere à sua regulamentação eficiente e segura.

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04 de junho de 2024
Vinicius Palermo
A Europa na Vanguarda: AI Act e a Regulamentação da Inteligência Artificial
O AI Act é a primeira iniciativa legislativa concreta para regulamentar a inteligência artificial.

A velocidade da evolução tecnológica representa um grande desafio para o Direito, principalmente no que se refere à sua regulamentação eficiente e segura. Dentre as importantes ferramentas amplamente utilizadas na sociedade moderna, temos a inteligência artificial. Esta tecnologia passou de um conceito meramente futurista para uma realidade tangível, atuando em diversos aspectos do nosso cotidiano. Com isso, surgem preocupações sobre a segurança, ética e impacto nos direitos fundamentais.

Neste cenário, a União Europeia introduziu o AI Act, uma regulamentação pioneira para garantir o desenvolvimento e uso responsável da inteligência artificial. O Conselho Europeu deu sua aprovação final no final de maio deste ano para que o AI Act da União Europeia seja sancionado. No presente artigo, vamos esclarecer os principais pontos dessa lei diante da sua importância e de sua influência em futuras legislações.

O AI Act é a primeira iniciativa legislativa concreta para regulamentar a inteligência artificial. Esta Lei Europeia estabeleceu regras para o desenvolvimento, comercialização e uso de sistemas de inteligência artificial na Uniao Europeia. O objetivo principal é transformar a Europa em um centro global de inteligência artificial confiável, protegendo os direitos fundamentais e promovendo a inovação e o investimento no setor.

A abrangência do AI Act é ampla, aplicável a todos os envolvidos no ciclo de vida da inteligência artificial, desde desenvolvedores até usuários finais. Portanto, o alcance da Lei Europeia inclui provedores, implementadores, importadores, distribuidores e fabricantes de produtos que incorporam inteligência artificial em seus negócios. É relevante destacar que a legislação também se aplica a sistemas de inteligência artificial desenvolvidos fora da União Europeia, mas cujos resultados são utilizados dentro do bloco europeu.

A Lei Europeia (AI Act) classifica os sistemas de inteligência artificial em quatro categorias de risco: inaceitável, alto, limitado e mínimo. Os sistemas de risco inaceitável são proibidos. São os casos de sistemas de pontuação social (avaliando ou classificando indivíduos com base em comportamento social ou características pessoais para gerar tratamento prejudicial) e compilação de bancos de dados de reconhecimento facial por meio de coleta indiscriminada de imagens da internet ou de circuito fechado de tv.

Os sistemas de alto risco são permitidos, mas devem cumprir requisitos rigorosos e passar por avaliações de conformidade, gestão de riscos, governança de dados, documentação técnica, registro e supervisão humana. São os casos de sistemas utilizados em processos de contratação ou avaliação de funcionários, sistemas de pontuação de crédito, processamento automatizado de sinistros de seguros ou definição de prêmios de risco para clientes.

Os sistemas incluídos na categoria de risco limitado requerem transparência, informando os usuários de que estão interagindo com inteligência artificial. Exemplos são chatbots e deepfakes.

A maioria das aplicações de inteligência artificial atualmente disponíveis no mercado se enquadra na categoria de risco mínimo, incluindo filtros de spam, jogos eletrônicos e videogames habilitados para inteligência artificial, que não são regulamentados.

Para estar em conformidade com o AI Act, as empresas devem adotar várias medidas, como inventário de modelos para a criação de um repositório de todos os modelos de inteligência artificial em uso e em desenvolvimento; classificação de riscos; projeto de sistemas éticos que respeitem os direitos fundamentais; e governança formal para garantir a conformidade contínua.

A violação da Lei Europeia sobre inteligência artificial gera penalidades pesadas. As punições previstas incluem multas que variam de €7,5 milhões a €35 milhões, ou 1% a 7% do faturamento anual global da empresa, dependendo da gravidade da infração.

Analistas, auditores e especialistas em compliance indicam que o setor financeiro é um dos mais afetados pelo AI Act, especialmente em áreas como avaliação de crédito e seguros. São nestes campos que a inteligência artificial desempenha um papel crucial. Os sistemas usados para avaliar a solvência de clientes e definir prêmios de seguro são classificados como de alto risco e, portanto, sujeitos a rigorosos requisitos de conformidade.

O AI Act da União Europeia está previsto para entrar em vigor entre o segundo e terceiro trimestres de 2024. Após essa data, haverá períodos de transição para diferentes categorias de conformidade, variando de seis a 24 meses. Trata-se de um cronograma estabelecido para permitir que as empresas se adaptem às novas regulamentações, de forma a assegurar que possam implementar os sistemas de governança e conformidade necessários para atender às exigências rigorosas da Lei Europeia sobre inteligência artificial.

A aprovação final do AI Act pelo Parlamento Europeu representa um marco definitivo na regulamentação da inteligência artificial não só na Europa, mas em todo o mundo. A Lei Europeia certamente servirá de modelo para outros países. No Brasil, a regulamentação do uso da inteligência artificial está sendo discutida por meio do Projeto de Lei 2338/2023. Este projeto revela a clara inspiração no AI Act da União Europeia, refletindo a mesma influência que a GDPR europeia (Regulamento Geral de Proteção de Dados) teve na formação da LGPD brasileira (Lei Geral de Proteção de Dados – Lei 13.709/2018).

Com a implementação do AI Act, a Europa mais uma vez se posiciona na vanguarda da regulamentação das novas tecnologias, estabelecendo um padrão global para o desenvolvimento e uso responsável da inteligência artificial. Seguindo as diretrizes europeias, o Brasil também caminha para uma regulamentação da inteligência artificial por meio de uma legislação que visa a garantir o desenvolvimento e utilização desta poderosa tecnologia de forma humana, justa e centrada nos direitos fundamentais.