O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reiterou que sua equipe está levantando todas as alternativas técnicas possíveis para a reforma do imposto de renda para apresentar ao presidente da República, Luiz Inácio Lula. Participante na segunda-feira do congresso Itaú BBA Macro Vision 2024, em São Paulo, Haddad ressaltou que não há prazo para envio das medidas para o Congresso, o que pode não ocorrer neste ano.
Ele disse que, em conjunto com a equipe do Ministério do Planejamento, estão levantando as deduções do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) por rubrica para determinar quem é favorecido pelas medidas.
Em relação ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), Haddad disse que há avaliação sobre dividendos, seguindo os parâmetros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), para que não haja comprometimento de investimentos ou promoção de injustiça tributária.
“Estamos em uma fase que, se às vezes vaza um documento, a pessoa acha que aquele documento que vazou é a proposta da Fazenda, e isso será um equívoco, porque essa proposta não está configurada. O que nós estamos nesse momento é uma espécie de ida ao Palácio do Planalto para apresentar para o presidente as variáveis que podem ser alteradas para melhor”, disse Haddad.
O ministro avaliou que, ao contrário da reforma sobre o consumo, a da renda ainda passa por uma fase de estudos mais preliminares tanto no âmbito do governo quanto do parlamento. “Tem um trabalho a ser feito, e nós queremos acertar, nós queremos, tanto do ponto de vista do consumo quanto da renda, aproximar o Brasil com o que tem de melhor no mundo.
Olhando para os nossos pares, olhando para a OCDE de uma maneira geral, mas olhando para os nossos pares em particular, lembrando que nós temos as despesas contratadas e, portanto, a neutralidade da reforma tem que estar garantida para não ter nenhum risco fiscal associado nem ao Imposto sobre o Consumo, nem ao Imposto sobre a Renda.
O pressuposto da reforma é, um, para a reforma sair, ela tem que ser neutra, o ajuste fiscal tem que estar em outro lugar, tem que ser buscado de outra forma”, disse.
Ele não fixou um prazo para o envio das propostas para a reforma da renda. “Não sei se será possível fazê-lo esse ano, até porque nós estamos com o calendário apertado e com tarefas inconclusas que nós gostaríamos de entregar esse ano, que é o programa do Planejamento com a Fazenda de revisão do gasto”, justificou.
O ministro afirmou que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia ainda tem algumas assimetrias e que deve tratar do tema durante uma viagem que fará à Europa no próximo mês.
“Mesmo com as correções e revisões propostas pelo Brasil, ele ainda contém algumas assimetrias. Contudo, eu volto à questão da economia e da política. Eu penso que é um acordo que, economicamente, pode trazer uma perspectiva nova para o Mercosul, e eu acredito que, politicamente, faria muito bem para o mundo”, disse o ministro.
Ele lembrou que neste mês estará em Washington para concluir a reunião da trilha financeira do G20, presidida pelo Brasil, e que em novembro estará na Europa. Na pauta, um dos temas será o acordo entre União Europeia e Mercosul. “Devo passar por Alemanha, França e talvez Reino Unido, mas por outras razões, não pelo acordo”, disse sem entrar em detalhes.
Questionado sobre a presidência brasileira do G20, Haddad disse que o País deixará marcas importantes. “O Brasil liderou um processo de discussão sobre desigualdade no mundo, sobre o desafio climático, sobre o desafio da fome e da pobreza, sobre alinhamento dos bancos multilaterais em proveito do desenvolvimento, em especial dos países de renda baixa, endividados. Eu acredito que a presidência do Brasil é um ponto fora da curva”, comentou.
Antes de encerrar sua participação, Haddad deixou um recado sobre a questão da transformação ecológica, uma das bandeiras da sua gestão. “Nós estamos falando pouco das oportunidades que estão se oferecendo para o Brasil. Eu penso que essas oportunidades podem, junto com a reforma tributária, os marcos de garantia e de seguro, junto com todas as reformas que estão sendo feitas, com o apoio do Congresso e da sociedade, eu penso que o plano de transformação ecológica é uma espécie de cereja do bolo, porque é o que pode dar um impulso ainda maior para o nosso PIB potencial”, disse.
O ministro afirmou que, apesar dos choques na economia brasileira, há chances de a inflação ficar dentro da meta e de a previsão de crescimento ser mais uma vez revisada. “Nós estamos crescendo, talvez a gente tenha que rever, ainda não, mas talvez a gente tenha que rever mais uma vez o PIB deste ano. A inflação, mesmo com um choque de oferta importante, por falta d’água, que impacta a produção de alimentos, energia elétrica, o desastre que aconteceu no Rio Grande do Sul, que foi enfrentado. Mesmo com esses choques todos, nós estamos discutindo se a inflação vai ficar dentro do teto da banda ou não”, disse, destacando que, com a perspectiva de ficar dentro da banda, a inflação ainda será menor do que a do ano anterior.
A meta de inflação para este ano é 3,0%, com margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual para cima ou para baixo. Portanto, o teto da meta seria 4,5% – o mercado projetou a inflação para este ano em 4,39% no boletim Focus desta semana.
“Eu compreendo um pouco da ansiedade e das angústias em relação a esse tema, mas eu não vejo risco de nós não endereçarmos esse assunto e voltarmos a ancorar as expectativas no curto prazo”, reiterou.
O ministro afirmou ainda que a proposta orçamentária para o próximo ano está mais bem calibrada que a primeira feita por este governo, que foi mais desafiadora. Ele ressaltou que na elaboração do Orçamento de 2024, havia muita aposta em receitas extraordinárias, que não se concretizaram, mas a arrecadação corrente surpreendeu.
“O Orçamento do ano passado foi muito desafiador, sobretudo porque havia divergências entre os técnicos da Fazenda, e eu me incluo entre os divergentes, inclusive porque eu entendia à época que a nossa receita ordinária estava subestimada e a nossa receita extraordinária estava superestimada. Ou seja, eu entendia que o orçamento que podia ser produzido no ano passado era melhor do que o que foi apresentado. Graças a Deus eu estava certo, porque o que evoluiu favoravelmente esse ano foi a receita ordinária e a receita extraordinária, que todo mundo estava muito confiante que ia acontecer, ela não aconteceu”, disse.
Para 2025, a peça já enviada para o Congresso é considerada mais equilibrada. Ele ponderou, no entanto, que o trabalho não está concluído porque o governo precisa ter certeza em relação à compensação para alguns gastos, sobretudo da desoneração da folha de pagamento, já que as medidas oferecidas pelo Congresso podem ser insuficientes. “Nós temos ainda, até o final do ano, um debate político com o Judiciário e o Legislativo em torno desse ponto, para garantir as compensações. Garantidas as compensações, eu penso que a execução do orçamento do ano que vem, ela é bem coerente”, comentou.
Ele ainda destacou os desafios de algumas pastas, como o Ministério do Desenvolvimento Social, que revisa os filtros dos programas sociais. “Precisamos calibrar os filtros, a área técnica está confortável com a decisão que foi tomada, não vai prejudicar ninguém que precise daquele programa social, mas é uma decisão que precisa ser tomada ao longo dos próximos meses para garantir que nenhuma daquelas rubricas esteja abaixo do necessário para honrar as obrigações”, observou.
O ministro da Fazenda disse também no mesmo evento que a economia trilha uma rota que pode resultar em grau de investimento até 2026, último ano do mandato do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Haddad afirmou também que o relatório da Moody’s, que colocou o Brasil a um nível do grau de investimento, é “muito fiel” ao que ele pensa.
“As condições para o Brasil se desenvolver estão quase dadas, mas não estão dadas. Tem um ajuste a fazer”, declarou o ministro ao interpretar a avaliação da agência de rating.
Haddad também assegurou que a visão da Fazenda é de não alterar o arcabouço fiscal. “Se defender a arquitetura do arcabouço, vamos chegar ao grau de investimento”, assinalou. “Estamos numa rota que pode nos dar o grau de investimento até 2026”, reforçou o ministro.
Ainda que sempre exista o desafio político na condução da política econômica, Haddad ponderou que as condições no Congresso pavimentam um “caminho tranquilo” no diálogo com parlamentares.