Economia
Inflação alta

Haddad diz que discussão sobre queda de juros é técnica

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que a discussão sobre corte de juros é legitima e não pode ser política.

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19 de maio de 2023
Vinicius Palermo
Haddad diz que discussão sobre queda de juros é técnica
Segundo Haddad, a discussão não é mais sobre o que o Banco Central (BC) deve fazer, mas sim "quando" a autoridade monetária começará a cortar os juros.

Ao considerar que as medidas do governo para reequilibrar as contas públicas abrem espaço ao início de uma distensão monetária, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que a discussão sobre corte de juros é legitima e não pode ser política.

“Essa discussão é técnica, não deve ser política. Ela é legitima Você pode ter dois economistas bem formados, um que acha que é melhor esperar e outro que pensa que pelo andar da carruagem já há espaço para que a política monetária reforce a política fiscal”, comentou em entrevista ao empresário Abilio Diniz no programa Caminhos, da CNN Brasil.

Segundo Haddad, a discussão não é mais sobre o que o Banco Central (BC) deve fazer, mas sim “quando” a autoridade monetária começará a cortar os juros. “Dentro da técnica, é possível você discutir”, assinalou o ministro da Fazenda, fazendo um paralelo com a Medicina. “Se isso não fosse possível, você jamais ouviria a segunda opinião do médico. Por que você ouve uma (segunda) opinião do médico? Para ouvir uma opinião política? Não, para ouvir uma opinião técnica, que valide a primeira opinião.”

Entre as ações tomadas para recompor as finanças do governo federal, Haddad salientou não ter sido fácil para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reonerar os combustíveis. Porém, avaliou que a medida foi compreendida pela sociedade. “Ninguém gosta de populismo que vai naufragar depois de dois anos.”

Na entrevista, Haddad manifestou também confiança na votação da reforma tributária, para a qual o Congresso, julgou, está pronto. Uma vez encaminhados o arcabouço fiscal e a reforma dos impostos sobre o consumo, o ministro adiantou que o governo deve avançar, a partir do segundo semestre, numa agenda com objetivos de médio e longo prazo que inclui transição energética, na qual o Brasil tem posição privilegiada por sua matriz limpa. Há um conjunto de 100 ações programadas e organizadas em seis eixos para completar a transição ecológica até o fim do mandato, informou.

Para Haddad, o governo está com mais noção de suas possibilidades e do nível de integração que precisa manter com os demais Poderes. Internamente, pontuou, podem haver divergências, arbitradas pelo presidente Lula. Contudo, “no básico” todos do governo convergem para o mesmo lugar, garantiu.

Em debate com Abilio sobre a origem dos problemas da maioria dos países – se por falta de projetos, como defendeu o ministro, ou por falta de gestão, como sustentou o empresário -, Haddad comentou que a máquina pública já foi melhor no Brasil. “Passamos por um desmantelamento da máquina pública, não diria em todos os setores”, afirmou o titular da Fazenda, apontando os ministérios de Ciência e Tecnologia, do Meio Ambiente, e da Saúde entre os que mais sofreram nos últimos anos.

“Essas coisas estão sendo recompostas”, afirmou. “No que diz respeito à Fazenda, quero dizer que as carreiras de Estado da Fazenda são carreiras de excelência. Você encontra técnicos de excelente qualidade, do assunto que você imaginar, e que agora se sentem, na minha opinião, um pouco mais valorizados e estimulados. Deixou-se de demonizar o serviço público”, acrescentou.

Ao ser questionado sobre os atritos do governo com setores do agronegócio, Haddad disse que sua interação com o setor é indireta, sendo mediada pelo Ministério da Agricultura. “O que a gente cuida, e cuida bem, é do Plano Safra”, pontuou.

Apesar dos recordes na produção de grãos – “a agricultura no País está indo bem”, defendeu -, ele manifestou preocupação com a queda em algumas culturas importantes, nas quais a produção per capita está caindo. Ainda assim, Haddad frisou que o agronegócio é a atividade onde a produtividade do trabalho mais cresce no Brasil.

Ao defender mudanças no regime de metas de inflação, o ministro criticou a fixação de objetivos anuais para a alta dos preços. Dando como exemplo os modelos americano e europeu, o ministro manifestou preferência por metas contínuas, a serem atingidas ao longo do tempo.

“Eu penso que há aperfeiçoamento a ser feito. Talvez a oportunidade seja agora”, afirmou Haddad em entrevista ao empresário Abilio Diniz, no programa Caminhos. Junto com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, Haddad tem assento no Conselho Monetário Nacional (CMN), onde são definidas as metas de inflação. Para o ano que vem, a meta central a ser perseguida é de 3%, porém o governo pressiona por mudanças no regime, como forma de abrir espaço para o corte de juros.

Haddad considerou as metas anuais uma especificidade “que não faz sentido”. Apenas Brasil e Turquia, observou, adotam o modelo. “Não faz sentido discutir no Conselho Monetário qual é a meta de inflação ano a ano”, assinalou.

“O que o mundo que adotou meta de inflação fez? Você analisa a economia do país, define um objetivo, não fixa o ano-calendário. Alguns chamam de meta contínua. Ou seja, se é 3%, persegue-se 3%”, acrescentou o ministro.

Haddad lembrou que, mesmo com a inflação a 8,5%, o Banco Central Europeu (BCE) calibra os juros para que o objetivo de baixar a alta dos preços para 2% seja alcançado respeitando uma série de variáveis. “Não para abrir mão de combater a inflação, que é a razão de ser do banco central, mas a trajetória, como ele desenha a trajetória”, disse Haddad.

Fernando Haddad afirmou que o deslocamento do eixo de produção para a Ásia traz desafios para as Américas. Segundo ele, esse movimento “inspira cuidado” e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ajudar no diálogo para reforçar o papel da América do Sul nesse processo.

“Eu penso que a América como um todo está em situação que inspira cuidado, inclusive os Estados Unidos. O eixo de produção está se deslocando para a Ásia. A liderança do Lula pode ser fundamental para reorganizar a América do Sul. Temos de considerar que Lula é um ativo do ponto de vista das relações internacionais”, disse.

Haddad ainda afirmou que a mudança na presidência do Mercosul, que passa a ser do Brasil, e da União Europeia, que será da Espanha, pode ajudar no acordo entre os dois blocos comerciais. Segundo ele, o Brasil deve se esforçar para convencer a Argentina sobre os benefícios do acordo e a Espanha deve sensibilizar a França.