Economia
Situação fiscal

Galípolo diz que meta de inflação não é para se discutir

“Na minha opinião, o Banco Central nem deveria votar na meta de inflação no Conselho Monetário Nacional”, disse o diretor de Política Monetária do BC.

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25 de abril de 2024
Vinicius Palermo
Galípolo diz que meta de inflação não é para se discutir
O diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo

O diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse que a viabilidade de cumprir a meta de inflação do Brasil, de 3%, é um “não-tema” para o Comitê de Política Monetária (Copom). “A meta não é para se discutir, é para se perseguir”, afirmou, em um evento organizado pela Upload Ventures, em São Paulo. “Na minha opinião, o Banco Central nem deveria votar na meta de inflação no Conselho Monetário Nacional.”

Galípolo defendeu que o BC deveria perseguir as metas estabelecidas pelo Poder democraticamente eleito. As declarações vieram em resposta a uma pergunta sobre a viabilidade de se atingir a meta de inflação de 3%, considerando a situação fiscal do País. Segundo Galípolo, essa dúvida aparece no mercado desde o ano passado.

Ele relatou que, quando chegou ao Banco Central, havia ceticismo no mercado sobre a possibilidade de cumprir o alvo. No segundo semestre de 2023, afirmou, a preocupação diminuiu e, agora, voltou a aparecer.

“Tem havido idas e vindas, e para a gente é perseguir a meta que foi determinada”, disse o diretor do BC.
Galípolo voltou a afirmar que “estamos num período de redução dos balanços dos bancos centrais e de juros mais altos”. A discussão, de acordo com ele, é sobre quão longo é o ‘higher for longer’ – ou seja, o período em que os juros precisarão ficar elevados por mais tempo -, especialmente nos Estados Unidos.
A questão, segundo Galípolo, é que a permanência do juro norte-americano em níveis altos aumenta a dificuldade na disputa por capital, já que há algum enxugamento da liquidez. Como o aumento da necessidade de rolagem da dívida norte-americana afeta a relação de oferta e demanda, o “yield” torna-se mais alto.

“Há uma adversidade adicional quando se fala de juro americano mais alto porque com o Tesouro americano pagando o juro o que paga, fica difícil competir por recursos”, destacou o diretor do BC.
Ainda, de acordo com Galípolo, o estresse nos juros de Treasuries hoje parece relacionado a leilão do Tesouro dos EUA. Para ele, a pressão de rolagem de dívida nos EUA vem crescendo.

Mesmo com juro mais alto e atividade mais resiliente, há um processo de desinflação global em curso, disse Galípolo, ao participar do Upload Summit, em São Paulo. Ao se referir mais especificamente ao Brasil, ele afirmou que o desafio do País está em promover um crescimento mais harmônico entre oferta e demanda já que o petróleo e as reservas internacionais colocam o País em uma situação bastante privilegiada.

Um problema, segundo o diretor, é que os gastos do governo fornecem resiliência para o crescimento econômico. “O platô do gasto do governo é bastante elevado desde a PEC da Transição”, disse, observando também que a demanda das famílias seguirá resiliente puxada por inflação e juros em queda e pelo impulso do Bolsa Família.

A avaliação do diretor do BC é de que mesmo com o cenário global mais adverso, o Brasil fica ainda melhor. “Estou otimista com o Brasil, e não é de agora”, disse.

Galípolo também voltou a reforçar que a maior parte dos bancos centrais do mundo recuou para uma situação de dependência de dados, o que ocorre com o BC brasileiro.

O diretor de Política Monetária do Banco Central defendeu que a autarquia tem de manter a posição de “parcimônia e serenidade” e evitar reagir muito rapidamente a variações de ativos, ainda que isso possa atrasar um pouco o seu processo de função de reação. “Acho importante a gente ter calma, entender como isso vai se desenrolar, ainda que o risco que você esteja correndo seja de estar um pouco mais atrasado nesse processo de função de reação”, disse.

Sobre a recente reprecificação dos preços de ativos globais, desencadeada pela mudança nas apostas sobre a trajetória de juros nos EUA, Galípolo defendeu que é necessário aguardar para ver como as variáveis financeiras vão afetar a trajetória da inflação brasileira.

“A gente não tem meta de diferencial de juros e não tem meta de taxa de câmbio, a gente tem meta de inflação, que vem se comportando bem”, disse o diretor do BC, citando a surpresa positiva no IPCA de março.

Ele lembrou que, no segundo semestre de 2023, a curva norte-americana chegou a abrir um ponto porcentual, mas o movimento acabou tendo um impacto contido nos ativos domésticos.

O diretor de Política Monetária do Banco Central disse ainda que o que a autarquia fez nos últimos dias de volatilidade do dólar foi deixar que o câmbio flutuante absorvesse a reprecificação global dos ativos com toda as vantagens que esta perna do tripé macroeconômico proporciona.

“Me parece que este é um movimento predominantemente de valorização do dólar. Se todo mundo vinha num ciclo de redução dos juros ou espera uma redução do juro, na Europa começando em breve e os Estados Unidos mantendo mais elevada, é normal que possamos assistir a um processo de fortalecimento do dólar”, disse Galípolo, durante o “Upload Summit”.

Ao tratar de moedas como o yuan, Galípolo disse que no Brasil já se vê bancos já fazendo linhas de swaps mais longas relacionadas a yuan e real.

“Acho que este é um tema benéfico e muitas vezes, nas conversas que temos com investidores internacionais, as reuniões sempre começam com um pedido de desculpas do lado brasileiro pelas complexidades e idiossincrasias do sistema tributário brasileiro, endereçadas agora com a reforma”, comentou Galípolo

Do outro lado, o que ele disse que se ouve, é que quando se compara com outros pares, o ambiente de negócios do Brasil não é dos piores e que muitos dos investidores estão se beneficiando dos investimentos feitos no País. Isso porque o sistema financeiro brasileiro é muito avançado e beneficia os investimentos sem contar com a tecnologia avançada no sistema financeiro.

“Mas citam a questão da volatilidade cambial como sendo um dos inibidores de investimentos de longo prazo no Brasil. A volatilidade do real pode se apresentar como eventual empecilho para investimentos”, disse.