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Acordo de leniência

Toffoli anula provas da Odebrecht e afirma que prisão de Lula na Lava Jato foi armação

Na decisão, o ministro declarou que a prisão do presidente Lula foi um dos maiores “erros jurídicos da história do País”.

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06 de setembro de 2023
Vinicius Palermo
Toffoli anula provas da Odebrecht e afirma que prisão de Lula na Lava Jato foi armação
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF)

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou na manhã de quarta-feira, 6, as provas obtidas contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelo acordo de leniência da Odebrecht no âmbito da Operação Lava Jato. Na decisão, o ministro declarou que a prisão do presidente Lula foi um dos maiores “erros jurídicos da história do País”.

“Pela gravidade das situações estarrecedoras postas nestes autos, somadas a outras tantas decisões exaradas pelo STF e também tornadas públicas e notórias, já seria possível, simplesmente, concluir que a prisão do reclamante, Luiz Inácio Lula da Silva, até poder-se-ia chamar de um dos maiores erros judiciários da história do país”, escreveu Toffoli no documento.

“Digo sem medo de errar, foi o verdadeiro ovo da serpente dos ataques à democracia e às instituições que já se prenunciavam em ações e vozes desses agentes contra as instituições e ao próprio STF. Ovo esse chocado por autoridades que fizeram desvio de função, agindo em conluio para atingir instituições, autoridades, empresas e alvos específicos”, disse ele.

O ministro afirmou ainda que a prisão se tratou de uma “armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado” pelo que chamou de meios “aparentemente legais”. Na análise de Toffoli, a operação não distinguiu, propositalmente, inocentes de criminosos. “Valeram-se, como já disse em julgamento da Segunda Turma, de uma verdadeira tortura psicológica, UM PAU DE ARARA DO SÉCULO XXI, para obter “provas” contra inocentes”, completou.

Por conta da “imprestabilidade dos elementos de prova obtidos a partir do Acordo de Leniência, celebrado pela Odebrecht”, Toffoli determinou o arquivamento de inquéritos ou ações judiciais pelos juízos competentes, “consideradas as balizas aqui fixadas e as peculiaridades do caso concreto”.

O ministro determinou também o acesso integral, pelo prazo máximo de dez dias, do material apreendido na Operação Spoofing a todos os investigados e réus processados com base em “elementos de prova contaminados”, em qualquer âmbito ou grau de jurisdição.

Por conta dessas ilegalidades processuais, Toffoli ainda determinou para se adotar “as medidas necessárias para apurar as responsabilidades não apenas na seara funcional, como também nas esferas administrativa, cível e criminal”.

A prisão de Lula foi decretada em abril de 2018, após o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) confirmar sua condenação no caso do triplex do Guarujá (SP). À época, era permitida a prisão após condenação em segunda instância. Foi com base em tal jurisprudência que o então juiz Sergio Moro expediu a ordem de prisão do petista.

O ministro declarou que as provas do acordo de leniência da Odebrecht não valem nem para o processo do presidente nem para qualquer ação judicial – em qualquer esfera – que usou tais elementos.

“As causas que levaram à declaração de imprestabilidade dos referidos elementos de prova são objetivas, não se restringindo ao universo subjetivo do reclamante Lula, razão pela qual o reconhecimento da referida imprestabilidade deve ser estendido a todos os feitos que tenham se utilizado de tais elementos, seja na esfera criminal, seja na esfera eleitoral, seja em processos envolvendo ato de improbidade administrativa, seja, ainda, na esfera cível”, afirmou o magistrado, no documento.

Toffoli, relator do caso no Supremo, disse que a Corte já concedeu essa extensão em outros casos, por decisões do ministro Ricardo Lewandowski e da Segunda Turma do STF. Por isso, o ministro resolveu estender os efeitos dessa decisão para todos os outros casos, para não ocorrer “iniquidades”, evitar “a multiplicidade de feitos nesta Suprema Corte, mas também para orientar o sistema de Justiça, evitando-se a ocorrência de nulidades após a instrução dos feitos ou mesmo após a prolação da sentença, na fase recursal”. Ou seja, o ministro também disse que a decisão é definitiva.

Toffoli também determinou acesso integral ao material apreendido pela Operação Spoofing aos investigados e réus processados com base em “elementos de prova contaminados”, em qualquer âmbito ou grau de jurisdição. A Operação Spoofing foi um desdobramento da Operação Lava Jato, em que foram expostas mensagens do Telegram entre autoridades que conduziam a investigação da Lava Jato.

O ministro afirmou que não houve cooperação internacional na ação penal contra o presidente. Essas provas, obtidas a partir de acordos de leniência com empreiteiras e delações premiadas, não poderiam ser usadas na investigação brasileira, de acordo com o ministro.

Segundo Toffoli, a produção de provas e a obtenção de provas já produzidas, para terem validade, precisam, necessariamente, ser solicitadas pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgão que integra a estrutura do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Isso porque o DRCI é a autoridade central brasileira e o canal de comunicação oficial para mediar esses processos e garante a legalidade das provas produzidas.

Toffoli demandou informações ao DRCI, que afirmou não ter encontrado pedido de cooperação jurídica internacional para instrução do processo da 13ª Vara Federal de Curitiba, no qual foi homologado o acordo de leniência da Odebrecht. “A Autoridade Central é o órgão técnico-especializado responsável pela legalidade, lisura, celeridade e efetividade da cooperação jurídica internacional”, afirmou o DRCI a Toffoli, no processo.

“Eventuais pedidos de auxílio em matéria penal no que diz respeito à produção de provas materiais e testemunhais ou ainda, a obtenção de provas já produzidas deve, necessariamente e de modo exclusivo, ser solicitadas por meio da autoridade central brasileira. De outro modo, tal prova não poderá ser utilizada em território nacional por estar imersa em ilegalidade, geradora de nulidade insanável”, completou a autoridade.

Toffoli deu direito aos réus de contestar “eventuais ilegalidades processuais que se projetam como reflexo da atuação coordenada entre acusação e magistrado, tal como revelado pelos diálogos contidos na ‘Operação Spoofing’.”