A primeira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve voltar a julgar uma ação que discute a incidência de PIS/Cofins sobre descontos e bonificações dados aos varejistas. O julgamento começou no final do ano passado e foi suspenso por pedido de vista. Até agora, dois dos cinco ministros votaram de forma favorável aos contribuintes.
Os descontos e bonificações são concedidos pelos fornecedores quando os revendedores precisam abater algum tipo de custo – decorrente da produção de materiais publicitários para divulgação das mercadorias ou de logística, por exemplo. Varejistas argumentam que esse desconto não gera um acréscimo de patrimônio das empresas, e por isso não deveria ser enquadrado como receita – base da incidência de PIS/Cofins.
A Corte avalia um recurso apresentado pela Cencosud Brasil contra decisão que a obrigou a recolher o tributo sobre descontos e bonificações de anos passados. A controvérsia ganhou corpo em 2017, quando a Receita Federal orientou os fiscais a cobrarem PIS/Cofins sobre os valores recebidos como bonificações e abatimentos de fornecedores. A partir de então, a prática que era frequente no varejo começou a ser multada.
Em sustentação oral, a advogada Ariane Costa Guimarães, do escritório Mattos Filho, que defende a varejista, argumentou que o desconto é uma forma de dividir despesas entre indústria e varejo. “Esses descontos representam redutores de custo. Assim sendo, não há que se falar em receita obtida por conta desses descontos”, afirmou no início do julgamento, em novembro.
Devido ao potencial impacto para todo o setor, o Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV) ingressou como amicus curie (parte interessada) no processo. “Para poder ganhar em termos de concorrência, (as varejistas) buscam descontos da indústria para oferecer os produtos de forma mais barata para o consumidor final”, defendeu em sustentação oral a advogada Betina Treiger Grupenmacher, que representa a IDV. “Ele não ganha receita com isso, ele deixa de gastar”.
Grupenmacher lembrou que os varejistas adquirem produtos em grande volume e, por isso, estabelecem contratos comerciais que contemplam descontos. Mas, para o procurador Sandro Leonardo Soares, representante da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não há como garantir que todos os contratos comerciais firmados entre varejistas e fornecedores se encaixam como descontos ou bonificações.
Ele citou reportagens que apontaram uma suposta “ditadura do varejo” – alta concentração no mercado que prejudicaria a indústria nas negociações. Segundo o procurador, há casos em que varejistas impõem “pedágios”, que se passam por descontos, aos fornecedores.
A ministra Regina Helena Costa, relatora da ação, acolheu a argumentação dos contribuintes. Para ela, o varejista incorre em despesa para o desempenho da sua atividade enquanto o fornecedor obtém receita mediante contratos de compra e venda. “Sob a perspectiva da aquisição dos produtos pelo revendedor, a bonificação atenua o montante a ser desembolsado a título de custo da operação.
Trata-se, portanto, de redução do valor de compra dos bens a serem posteriormente comercializados”, afirmou em seu voto. Ela também defendeu que a distinção entre a natureza dos descontos concedidos, para evitar fraudes, deve ser averiguada pelo Fisco.
Embora seja inédito na Justiça, o tema já foi enfrentado no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em novembro do ano passado. O órgão administrativo reconheceu que PIS e Cofins não incidem sobre bonificações e descontos comerciais incondicionais (são “incondicionais” os descontos que não estão sujeitos a qualquer restrição futura). Entre os conselheiros, prevaleceu o entendimento de que os descontos não constituem receita, mas recuperação de custos.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) também tomou decisão favorável aos varejistas em julgamento de 2022. O tribunal entendeu que, “ao comprar com desconto, o contribuinte reduz o seu custo de aquisição e isso não tem a natureza jurídica de receita para efeitos de incidência das contribuições ao PIS e Cofins”.