Suellen Escariz
Suellen Escariz
Pelo mundo

Proteção aos trabalhadores em “gig economy”

A previsão de que o bloqueio e/ou a extinção da conta do trabalhador de uma plataforma sejam fundamentados é um direito igualmente fundamental, que não pode ser “transitório”.

Compartilhe:
09 de fevereiro de 2023
Proteção aos trabalhadores em “gig economy”
Foto: Divulgação

A Revolução 4.0 é resultado de uma inovação tecnológica, a “internet das coisas”, o Big Data, repercutindo reflexos nas mais diversas esferas jurídicas, bem como nas relações de trabalho.

Nesse contexto, insere-se o trabalho por meio de plataformas digitais, através da “gig economy” em que há intermediação entre o prestador de serviços e o cliente por meio de aplicativos, com prestação de serviços de acordo com a demanda.

A pandemia de coronavírus e as medidas de enfretamento e afastamento social (Lei 13.479/20) aceleraram a demanda por trabalhadores que prestam serviços através de aplicativos. Finalmente em 2022 foi promulgada a Lei 14.297/22, que traz medidas de proteção asseguradas aos entregadores (art. 1º).

No entanto, a Lei fez a ressalva de que as medidas previstas deviam ser asseguradas até que seja declarado o término da Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), ou seja, a lei tem a característica de ser temporária.

Entretanto, analisando as medidas previstas na referida Lei, uma crítica que se faz diz respeito à validade de tais previsões somente para o período de calamidade pública, o que fere princípios como o do não retrocesso e da condição mais benéfica, podendo ferir até mesmo o patamar mínimo civilizatório.  

Uma vez que há previsão de direitos mínimos a serem garantidos ao trabalhador, tendo por base a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a redução dos riscos inerentes ao trabalho, a promoção da saúde e do meio ambiente do trabalho sadio e seguro.

Nesse sentido, o fornecimento de água potável e sanitários, seguro contra acidentes de trabalho (art. 20, Lei 8213/91), fornecimento de máscaras e álcool gel, assistência financeira em razão de afastamento por infecção (arts. 3º/6º, da Lei 14/297/22), junto com outras medidas de proteção, deveriam ser perenes e não temporárias.

Da mesma forma, a previsão de que o bloqueio e/ou a extinção da conta do trabalhador de uma plataforma sejam fundamentados é um direito igualmente fundamental, que não pode ser “transitório”.

Trata-se da chamada transparência algorítmica e coaduna-se com a LGPD, que coloca a boa-fé, a transparência e a prestação de contas como princípios aplicáveis ao tratamento de dados pessoais, prevendo o direito de solicitar revisão de decisões automatizadas. Independentemente da discussão doutrinária e até de decisões judiciais divergentes acerca da existência ou não de vínculo empregatício, conclui-se pela necessidade de preservação dos direitos previstos na referida lei, permitindo ao Judiciário a aplicação da Lei mesmo após o período da calamidade pública.