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Renegociação

Marinha diz que cortes não comprometem Prosub

Segundo o comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, as cerca de 200 demissões em abril representam menos de 10% do pessoal envolvido no Prosub.

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30 de abril de 2024
Vinicius Palermo
Marinha diz que cortes não comprometem Prosub
O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen

O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, disse na segunda-feira, 29, que cortes orçamentários e redução de pessoal ligado ao Prosub, o programa de submarinos da Marinha, não comprometem o projeto, mas podem impor renegociação de contratos, onerando o custo total. Segundo Olsen, as cerca de 200 demissões em abril representam menos de 10% do pessoal envolvido no Prosub.

Um dia depois da visita dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron, da França, às instalações do Prosub, em Itaguaí, por ocasião do lançamento do submarino Tonelero, em março, a Marinha teve bloqueados 83% dos recursos destinados ao programa. Como resultado, a Itaguaí Construções Navais (ICN) demitiu em abril 200 funcionários envolvidos na construção dos veículos.

Olsen minimizou o impacto dos cortes e disse que renegociações de contratos acontecem desde 2008. Ele falou a jornalistas na saída de seminário sobre transição energética na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro.

“Em mais de 15 anos de desenvolvimento do Prosub, é natural que ele demande ajustes. No momento entregamos o terceiro submarino convencional e, no ano que vem, entregaremos o quarto desse tipo”, disse.

A expectativa é que o quinto e mais esperado submarino, de propulsão nuclear, seja entregue em 2034 para ser incorporado à frota da Marinha em 2037. Esse processo de incorporação demora cerca de um ano para submarinos tradicionais, mas, no caso de submarinos nucleares, leva em média cinco anos.
“Já temos em fabricação a seção de qualificação e espero assinar ou ter o modelo de negócios para o submarino nuclear até o fim deste ano”, disse.

Embora julgue o Prosub preservado, Olsen disse que as demissões são uma preocupação porque a Marinha pode não conseguir recontratar essa mesma mão de obra especializada à frente.

“Dentro da construção naval, essa flutuação populacional de empregados é normal. O que me preocupa é perdermos esse pessoal definitivamente”, disse.

“Em eventual movimento para recontratar os funcionários ora dispensados, eles podem já ter sido absorvidos pela indústria naval devido a todo o esforço que o governo federal está fazendo nessa frente”, continuou. Se isso acontecer, afirmou, será necessário captar pessoal novo e capacitar, o que não impactaria nos prazos de entrega, mas, certamente, no custo.

O comandante da Marinha lembrou que o Prosub gera dezenas de milhares de empregos diretos e indiretos e compõe um projeto científico tecnológico maior, voltado à aplicação da energia nuclear, que se soma ao domínio do processo de enriquecimento do urânio e produção de reatores de reatores nucleares de pequeno porte.

Um submarino nuclear, afirmou, é o que há de mais moderno para as Forças Armadas, com curva de aprendizado tecnológico “muito acima” de blindados ou caças, armas características das outras duas Forças, Exército e Aeronáutica.

O comandante da Marinha voltou à carga contra a inscrição do marinheiro João Cândido, o Almirante Negro, no livro dos Heróis da Pátria e negou que a resistência da Armada à homenagem é discriminatória ou racista. Olsen reconheceu a prática de açoite a praças até o início do século XX, que definiu como “condenável”, mas disse que isso não justifica a tomada de quatro navios da Marinha e os ataques ao Rio de Janeiro, então capital federal.

Na semana passada, o comandante da Marinha enviou carta de repúdio à Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, criticando a homenagem a Cândido. O documento repercutiu mal na opinião pública.

“Eu me posicionei baseado em fatos. Não tenho nenhuma conotação ideológico-partidária. A carta procurava fazer uma síntese, um apanhado dos fatos que aconteceram em 1910. E o entendimento da Marinha é que não cabe inscrever João Cândido como herói da Pátria. Mas há o contraditório, que é enriquecedor. A proposta passou no Senado. Então, há instâncias com a compreensão de que ele atende aos requisitos”, disse o comandante.

Olsen emendou dizendo que a resistência a Cândido não é racista ou discriminatória. “A posição da Marinha não é de racismo, absolutamente. A Marinha é uma instituição que se posiciona pelo mérito”, diz.

Em seguida, o comandante da Marinha afirmou que a Força já tem como herói Marcílio Dias, “também marinheiro, negro e nascido no Sul do País”. Marcílio Dias se destacou na Batalha naval do Riachuelo, na Guerra do Paraguai, em 1865, quando teve o braço decepado e morreu. Ele entrou no livro dos Heróis da Pátria em dezembro de 2022, ainda sob o governo Jair Bolsonaro.

Questionado se as ações de Cândido e sua Revolta da Chibata não seriam legítimas ante os açoites aos praças da Marinha até o início do século XX, Olsen disse que as torturas eram “absolutamente condenáveis”, mas não justificam as ações dos revoltados.

“O açoite é absolutamente condenável. Mas não se pode tomar as armas, especificamente quatro navios, matar o seu comandante, urinar em seu corpo depois da morte e matar oficiais e marinheiros que não aderiram. Não se pode ameaçar e engajar contra a capital federal com dois navios”, afirmou o comandante, listando consequências do levante.

Ele seguiu reconhecendo a tortura no passado da Marinha e disse que se tratava de “condições próprias da época”.

“Julgar o contexto da época com os valores de hoje é difícil. Os marinheiros eram captados para servir. Eram pessoas que não tinham origem, sem procedência. Portugal pegava presidiários e os recrutava. Eram pessoas que estavam na vadiagem, sem as qualificações que temos hoje”, disse Olsen.

Especificamente sobre Cândido, ele sugeriu que o marinheiro foi instrumentalizado por outros oficiais com interesses escusos. “Os fatos mostram que João Cândido foi colocado como líder desse movimento (Revolta da Chibata) por uma questão de conveniência. Ele era afeito a oficiais, muito próximo de uma oficialidade e foi posto lá por essas pessoas que queriam, de alguma maneira, dar seguimento às suas ações”, completou.