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Lula diz que não medirá esforços para colocar desigualdade no centro da agenda

Segundo o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, a governança mundial trata injustiças como “fenômenos naturais” da humanidade.

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19 de setembro de 2023
Vinicius Palermo
Lula diz que não medirá esforços para colocar desigualdade no centro da agenda
Presidente Lula discursa na abertura do Debate Geral da 78º Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York. Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, iniciou seu discurso na 78ª Sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) criticando as desigualdades do atual sistema de governança global e destacando que as oportunidades que cada criança terá são traçadas “ainda no ventre da mãe”. Segundo ele, a governança mundial trata injustiças como “fenômenos naturais” da humanidade.

“O destino de cada criança que nasce neste planeta parece traçado ainda no ventre de sua mãe. Se irá fazer todas as refeições ou se terá negado o direito de tomar café da manhã, almoçar e jantar diariamente”, disse o presidente do Brasil, durante discurso da 78ª Sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), na terça-feira, 19.

Como é tradição, o presidente brasileiro é o primeiro a discursar em Nova York. “É preciso, antes de tudo, vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural. Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo”, acrescentou o presidente.

Na fala, o brasileiro trouxe dados que mostram que os 10 maiores bilionários do mundo possuem mais riqueza que os 40% mais pobres da humanidade. Lula volta ao discurso na ONU após 14 anos. Ele lembrou que, há 20 anos, ocupou a tribuna pela primeira vez e, na terça, retornou com “inabalável confiança na humanidade”.

Em 2003, conforme comentou, o mundo ainda não havia se dado conta da gravidade da crise climática. “Hoje, ela bate às nossas portas, destrói nossas casas, nossas cidades, nossos países, mata e impõe perdas e sofrimentos a nossos irmãos, sobretudo os mais pobres”, disse.

No discurso, ele também retomou o debate sobre a fome. “A fome, tema central da minha fala neste Parlamento Mundial 20 anos atrás, atinge hoje 735 milhões de seres humanos, que vão dormir esta noite sem saber se terão o que comer amanhã”, disse. Em sua visão, o mundo está cada vez mais desigual.

No início, Lula também manifestou condolências às vítimas de terremotos no Marrocos e tempestade na Líbia e citou o ciclone extratropical que atingiu o Rio Grande do Sul nas últimas semanas.

O presidente afirmou que países em desenvolvimento, como o Brasil, não querem repetir o modelo de países desenvolvidos que cresceram, segundo ele, a partir de um modelo baseado na emissão de altas taxas de gases poluentes. Lula disse que a emergência climática torna urgente uma correção de rumos e a implantação de normas que já foram acordadas.

“Países ricos cresceram com modelo baseado em altas taxas de emissão de gases (…) 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por quase a metade de todo carbono lançado na atmosfera. Nós, países em desenvolvimento, não queremos repetir esse modelo”, disse o presidente do Brasil, ao reforçar que provará, mais uma vez, que o modelo justo e ambientalmente sustentável é possível de ser implementado.

Lula afirmou que o Brasil está na vanguarda da transição energética, com uma das matrizes mais limpas do mundo. Ele citou que 87% da energia elétrica do País provém de fontes de energias renováveis.

O presidente do Brasil disse ainda que, desde o início do governo, o Brasil retomou uma agenda robusta de fiscalização e combate a crimes ambientais na Amazônia.

“Ao longo de 8 meses, o desmatamento na Amazônia já foi reduzido em 48%. O mundo inteiro sempre falou da Amazônia, agora é a Amazônia que está falando por si mesma”, afirmou Lula.

O presidente usou o seu discurso na Assembleia-Geral das Nações Unidas para reivindicar a reforma do Conselho de Segurança da ONU que, segundo ele, vem perdendo “progressivamente sua credibilidade”.
“Essa fragilidade do conselho decorre em particular da ação de seus membros permanentes, que travam guerras não autorizadas em busca de expansão territorial ou de mudança de regime”, disse o presidente do Brasil, no primeiro discurso dos chefes de Estado da assembleia.

Lula apontou a paralisia do conselho como a “prova mais eloquente” da necessidade e urgência de reformá-lo, de modo a conferir ao colegiado maior representatividade e eficácia.

O presidente afirmou ainda que a ação coletiva da ONU, voltada para o desenvolvimento e com foco na agenda de 2030, pode se transformar no seu maior fracasso. Segundo Lula, as metas de redução da desigualdade ainda estão distantes de serem cumpridas.

“A mais ampla e ambiciosa ação coletiva da ONU, voltada para o desenvolvimento, agenda 2030, pode se transformar no seu maior fracasso. Estamos na metade do período de implantação e ainda muito distante das metas definidas. A maior parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável caminha em ritmo muito lento. O imperativo moral e político de erradicar pobreza e acabar com fome parece estar anestesiado”, afirmou.

Lula disse que, a 7 anos do prazo final da agenda de 2030 estabelecida pela ONU, será preciso incluir pobres no orçamento e fazer ricos pagarem impostos proporcionalmente ao seu patrimônio para garantir, de fato, uma redução na desigualdade entre os países.

Ele reforçou que o Brasil está comprometido com os 17 objetivos do desenvolvimento sustentável e repetiu que o País resgatou o universalismo na política externa.