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Lula afirma que juros ainda estão altos e vai continuar brigando

Durante cerimônia comemorativa de programas de microcrédito produtivo e orientado do Banco do Nordeste (BNB), em Fortaleza, ele avaliou que a taxa de juros segue alta.

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02 de setembro de 2023
Vinicius Palermo
Lula afirma que juros ainda estão altos e vai continuar brigando
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a cerimônia comemorativa de 18 anos de criação do Programa Agroamigo e de 25 anos do Programa Crediamigo, na sede do Banco do Nordeste. Fortaleza - CE. Foto: Ricardo Stuckert / PR

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a criticar, na sexta-feira (1º), os juros praticados no país e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Durante cerimônia comemorativa de programas de microcrédito produtivo e orientado do Banco do Nordeste (BNB), em Fortaleza, ele avaliou que a taxa de juros segue alta. “Vamos continuar brigando.”

“É por isso que nós vamos continuar fazendo crédito e vamos fazer cada vez mais. Não pense que acho que o juro está baixo. O juro ainda está alto porque 2,16 ao mês é muita coisa, dá quase 30% ao ano, porque é juro sobre juro. Acho que vamos baixar ainda. Obviamente que nós também não queremos quebrar o banco, porque o banco tem que dar o lucro. Se quebrar, vai ser muito pior pra nós – além de ficarmos devendo, não temos o banco para emprestar.”  

“A Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil, o Basa, o BNB e o BNDES só têm sentido existir se for para fazer as coisas diferentes do que fazem os bancos privados. Se for para fazer igual, não precisa existir”, disse. “Temos que ter dinheiro para investir e dinheiro para ser investido a juros baratos. Por isso é que o cidadão do Banco Central precisa saber que ele é presidente do Banco Central do Brasil e não do Banco Central de um país que não seja o Brasil e que precisa baixar os juros.”

Durante o evento, Lula lembrou que Campos Neto foi indicado ao cargo ainda no governo de Jair Bolsonaro e que o Banco Central atua de forma autônoma. “Não há mais interferência da Presidência da República, que podia chamar o presidente do Banco Central e conversar. Esse cidadão, se ele conversa com alguém, não é comigo. Ele deve conversar com quem o indicou. E quem o indicou não fez coisas boas nesse país. A sociedade brasileira vai descobrir com o tempo”, concluiu.

Os juros médios dos bancos vêm caindo nos últimos meses, segundo dados do BC. Considerando o conjunto dos recursos livres e direcionados para pessoas físicas, o pico dos juros aconteceu em maio: 38,2% ao ano. Para empresa, o pico foi em janeiro: juros a 22,2%. Desde então, há redução nas taxas mês a mês, com flutuações, e desaceleração no crescimento em 12 meses.

No crédito livre, os bancos têm autonomia para emprestar o dinheiro captado no mercado e definir as taxas de juros cobradas dos clientes. Já o crédito direcionado – com regras definidas pelo governo – é destinado basicamente aos setores habitacional, rural, de infraestrutura e ao microcrédito.

O comportamento dos juros bancários médios ocorre em um momento em que a expectativa do mercado financeiro é de queda da taxa básica de juros da economia, a Selic, atualmente em 13,25% ao ano. Definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, a Selic é o principal instrumento usado pela autoridade monetária para alcançar a meta de inflação.

Diante da forte queda da inflação, o Copom iniciou, no mês passado, um ciclo de redução da Selic. A última vez em que o BC tinha diminuído a Selic foi em agosto de 2020, quando a taxa caiu de 2,25% para 2% ao ano, em meio à contração econômica gerada pela pandemia de covid-19.

Depois disso, o Copom elevou a Selic por 12 vezes consecutivas, num ciclo que começou em março de 2021, em meio à alta dos preços de alimentos, de energia e de combustíveis, e, a partir de agosto do ano passado, manteve a taxa em 13,75% ao ano por sete vezes seguidas.

Até o fim do ano, a previsão dos analistas é que a Selic caia para 11,75%. Com isso, a taxa de captação dos bancos (o quanto é pago pelo crédito) vem recuando. Desde abril, ela está em queda e ficou em 11,3% em julho.

A elevação da taxa básica ajuda a controlar a inflação porque causa reflexos nos preços, já que juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança, contendo a demanda aquecida.

Entretanto, em julho, o crédito rotativo do cartão de crédito cresceu novamente, indo para 445,7% ao ano. O rotativo é o crédito tomado pelo consumidor quando paga menos que o valor integral da fatura do cartão e dura 30 dias.

A modalidade é uma das mais altas do mercado, e o Banco Central já estuda o fim do crédito rotativo do cartão de crédito. 

Citando a baixa inadimplência dessas carteiras, Lula afirmou que os bancos não podem ter medo de emprestar para as pessoas mais pobres.

“É preciso convencer a maioria dos economistas desse país de que é possível. Quando digo que a melhor coisa que a gente fez nesse país foi colocar o pobre no orçamento, a melhor coisa que a gente fez nesse país foi dar vez e voz a quem não tinha nem vez e nem voz”, destacou Lula.

“A gente não pode ter medo de emprestar dinheiro pra pobre se a gente tiver um compromisso de ajudá-los a desenvolver aquilo que eles podem fazer. Hoje, no Brasil, há milhões de mulheres e homens que não querem mais trabalhar de carteira assinada. Eles não querem ter chefes dando pitaco na vida deles, eles querem ser empreendedores, querem trabalhar por conta própria. E quem é que pode ajudá-los se não o Estado com os seus bancos públicos, que podem dar o primeiro voto de confiança a essas pessoas?”, acrescentou.

Lula afirmou que, com o crescimento da economia, essa riqueza precisa ser distribuída. O presidente se comprometeu a aumentar os recursos para investimento no país. 

“Muita gente que pega dinheiro com vocês, que compra alguma coisa, que produz alguma coisa, esse dinheiro vai gerar mais emprego, mais desenvolvimento, mais comércio, vai gerar mais fábrica. E aí a gente percebe que vai acontecer duas coisas importantes, a economia vai crescer, mas ela crescendo ela precisa ser distribuída”, disse.

“Eu vivi o crescimento econômico da década de 70, o famoso milagre brasileiro, em que a economia crescia 14% ao ano. E depois que o Dieese levantou, as pessoas tinham ficado mais pobres porque o dinheiro ficou muito concentrado na mão de pouca gente”, argumentou o presidente.

O Programa Agroamigo está completando 18 anos de criação e o Programa Crediamigo, 25 anos.

O primeiro é destinado a agricultores familiares enquadrados no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e visa a inclusão produtiva e diversificação de atividades dos produtores. Ele atende 1,3 milhão de produtores rurais com microcrédito, com carteira ativa de R$ 6,6 bilhões.

Desde sua criação, o Agroamigo aplicou mais de R$ 29,3 bilhões em 7,2 milhões de operações contratadas. O perfil dos clientes desta modalidade mostra que 75% estão na região do semiárido e quase a metade (47,5%) são mulheres.

Segundo Lula, o Brasil tem 4,6 milhões de propriedades no Brasil com menos de 100 hectares e é preciso “acreditar no investimento no pequeno e no médio”.

“Somos gratos aos grandes produtores rurais que sustentam a China com soja, uma parte da Europa com milho e algodão e são muito importantes para o Brasil. Mas a gente tem que levar em conta que o cara que tem uma plantação de 50 mil hectares de soja não vai perder tempo criando galinha caipira, criando um porquinho, três vaquinhas leiteiras, plantando hortaliça. Ele precisa comprar de quem? Do pequeno e do médio produtor, que é quem coloca mais de 70% do alimento que vai nas nossas mesas, nos hotéis e restaurantes o país”, disse o presidente.

Já o Crediamigo é um programa de microcrédito urbano para pequenos empreendedores e oferece serviços de microfinanças e orientação empresarial. Ele atende, atualmente, cerca de 2 milhões de pessoas em quase 2 mil municípios na área de atuação do BNB. A carteira ativa é de R$ 4,9 bilhões.

Em 25 anos, o Crediamigo já emprestou R$ 113,2 bilhões em 55,6 milhões de operações. Entre seus clientes, 18% têm renda familiar mensal de até R$ 700 e 16% têm renda familiar de R$ 700 até R$ 1 mil.