Economia
Orçamento 2024

Governo publica MP e PL com foco na tributação das empresas

A primeira é uma Medida Provisória (MP) para regulamentar decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre impostos que devem ser recolhidos pelas companhias.

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31 de agosto de 2023
Vinicius Palermo
Governo publica MP e PL com foco na tributação das empresas
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, durante entrevista coletiva,  para apresentar e explicar os números do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2024. Foto Antonio Cruz/Agência Brasil.

O governo publicou na quinta-feira, 31, as duas últimas medidas que vão compor o pacote arrecadatório do Orçamento de 2024 – ambas com foco na tributação das empresas.

A primeira é uma Medida Provisória (MP) para regulamentar decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre impostos que devem ser recolhidos pelas companhias. Como se trata de MP, a vigência é imediata e o Congresso tem 120 dias para aprovar o texto. Caso contrário, ele perde a validade. Já a segunda será um Projeto de Lei para acabar com a dedutibilidade (possibilidade de abatimento nos tributos devidos) dos chamados Juros sobre Capital Próprio (JCP).

O JCP é um instrumento usado por grandes empresas para remunerar acionistas. Ele permite que a distribuição de lucros seja enquadrada como despesa – e, assim, abatida do Imposto de Renda.

Juntas, as medidas têm o potencial de arrecadar R$ 45,3 bilhões em 2024, segundo estimativas da equipe econômica. Trata-se de uma fatia considerável da cifra perseguida para o próximo ano: R$ 168 bilhões em receitas extras, com o objetivo de zerar o déficit nas contas públicas.

A MP está embasada em uma decisão de abril do STJ, que impede que benefícios estaduais sejam abatidos de tributos federais, a não ser em caso de investimentos. Logo, as empresas terão de pagar mais impostos. A expectativa é de que a arrecadação alcance R$ 35,3 bilhões.

O objetivo do governo é regulamentar esse acórdão do STJ, detalhando as regras que passarão a vigorar daqui para frente no recolhimento desses tributos. Segundo fontes da equipe econômica, o texto não vai tratar do estoque, ou seja, de pagamentos anteriores que tenham sido feitos de forma indevida.

Interlocutores do Ministério da Fazenda procuraram o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para alinhar o envio da proposta por meio de MP, que tem vigência imediata. O instrumento legislativo tem sido alvo de duras críticas por parte de Lira, que prefere a tramitação via PL, para dar maior protagonismo aos deputados.

Para o fim da dedutibilidade do JCP, a expectativa do governo é arrecadar R$ 10 bilhões em 2024. Na prática, o PL acaba com a possibilidade de as empresas abaterem do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) a distribuição de lucros aos acionistas via JCP.

O foco do governo, ao mirar nesse instrumento, é atacar o planejamento tributário agressivo feito por empresas de grande porte da chamada economia real para não pagar IR.

Fontes da equipe econômica, no entanto, reconhecem que, no caso dos bancos, há uma preocupação de não encarecer o crédito, já que as instituições financeiras têm tratamento regulatório distinto.

Integrantes da Fazenda afirmam que o debate com os bancos deverá ser feito no Congresso, uma vez que o projeto a ser enviado será um ponto de partida, mas que “ainda precisa ser construído”. A Fazenda, portanto, não vai apressar a tramitação desse texto, segundo interlocutores.

Por esse motivo, a expectativa de receita com a medida é a mais incerta do pacote, na avaliação da Fazenda, segundo apurou a reportagem.

O plano da Receita Federal para combater a sonegação em compras em sites internacionais, como nas plataformas Shein, Shopee e Aliexpress, será contabilizado no Orçamento de 2024, como parte do esforço arrecadatório do governo para zerar o déficit público no ano que vem. Haverá uma previsão de receitas extras com essa medida da ordem de R$ 1,8 bilhão.

A equipe econômica tem o desafio de elevar a arrecadação em R$ 168 bilhões no próximo ano para conseguir equilibrar receitas e despesas – meta vista com ceticismo dentro do Congresso Nacional e por parte do mercado financeiro. Interlocutores do Ministério da Fazenda reconhecem que a tarefa não é simples, mas acreditam que seja factível.

Um dos pontos que destacados pelas autoridades na quinta-feira, para tentar diminuir o grau de desconfiança, é de que os números são conservadores e feitos por técnicos com larga experiência em contas públicas.

Para tentar viabilizar a meta do déficit zero, Fazenda e Planejamento contam com medidas que se dividem em três eixos: recuperação da base fiscal (mudanças no tribunal da Receita Federal, o Carf, e regulamentação da decisão do STJ sobre benefícios fiscais); isonomia tributária (taxação dos fundos dos “super-ricos” e fim dos Juros sobre Capital Próprio); e nova relação do Fisco com o contribuinte (negociações tributárias com grandes devedores). Além disso, correndo por fora, há a tributação das apostas esportivas e o combate à sonegação no e-commerce.

Fontes da equipe econômica alegam que, caso haja frustração na receita dessas medidas, há outras cartas na manga, como o projeto que permite a repatriação de ativos, em discussão no Congresso; e a mudança nos chamados “preços de transferência”, que eliminou brechas utilizadas por grandes empresas para recolher menos tributos nas operações de exportação.

Batizado de Remessa Conforme, o programa dá isenção de Imposto de Importação nas compras até US$ 50 para as varejistas que cobrarem os tributos de forma antecipada, no momento em que o produto é adquirido. Hoje, essa cobrança só ocorre quando a mercadoria chega ao País.

O benefício não se estende ao ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), que é estadual e passou a ter alíquota padrão de 17% nessas operações.

Na semana passada, o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, afirmou que a ilegalidade no comércio eletrônico internacional é “grande” e que o Fisco está tomando medidas “firmes” para trazer essas empresas para a chamada conformidade, ou seja, se enquadrarem na legislação brasileira.

“Estamos chegando a 30% de declarações realizadas (do total de encomendas que chegam ao País). Antes eram apenas 2% ou 3%. E devemos chegar ao final do ano com 100% dos itens declarados”, afirmou o secretário, na ocasião. O aumento da fiscalização no e-commerce é um pleito antigo das varejistas nacionais, que apoiam o plano, mas tem duras críticas à isenção de impostos federais, a qual pode ser revista.