Economia
Moderação

Copom interrompe cortes e mantém juros básicos em 10,5% ao ano

A manutenção ocorre após o Copom reduzir a Selic por sete vezes seguidas. Na última reunião, em maio, a velocidade dos cortes diminuiu.

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20 de junho de 2024
Vinicius Palermo
Copom interrompe cortes e mantém juros básicos em 10,5% ao ano
Integrantes do Comitê de Política Monetária em reunião

A alta recente do dólar e o aumento das incertezas econômicas fizeram o Banco Central (BC) interromper o corte de juros iniciado há quase um ano. Por unanimidade, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa Selic, juros básicos da economia, em 10,5% ao ano. A decisão era esperada pelos analistas financeiros.

A manutenção ocorre após o Copom reduzir a Selic por sete vezes seguidas. Na última reunião, em maio, a velocidade dos cortes diminuiu. De agosto do ano passado até março deste ano, o Copom tinha reduzido os juros básicos em 0,5 ponto percentual a cada reunião. Em maio, a taxa tinha sido cortada em 0,25 ponto percentual.

A taxa está no menor nível desde fevereiro de 2022, quando estava em 9,75% ao ano. De março de 2021 a agosto de 2022, o Copom elevou a Selic por 12 vezes consecutivas, num ciclo de aperto monetário que começou em meio à alta dos preços de alimentos, de energia e de combustíveis. Por um ano, de agosto de 2022 a agosto de 2023, a taxa foi mantida em 13,75% ao ano por sete vezes seguidas, quando começou a ser reduzida.

Antes do início do ciclo de alta, a Selic estava em 2% ao ano, no nível mais baixo da série histórica iniciada em 1986. Por causa da contração econômica gerada pela pandemia de covid-19, o Banco Central tinha derrubado a taxa para estimular a produção e o consumo. A taxa ficou no menor patamar da história de agosto de 2020 a março de 2021.

A Selic é o principal instrumento do Banco Central para manter sob controle a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em maio, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial, subiu para 0,46%. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os alimentos puxaram o indicador após as enchentes no Rio Grande do Sul.

Com o resultado, o indicador acumula alta de 3,93% em 12 meses, cada vez mais distante do centro da meta deste ano. Para 2024, o Conselho Monetário Nacional (CMN) fixou meta de inflação de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual. O IPCA, portanto, não podia superar 4,5% nem ficar abaixo de 1,5% neste ano.

No último Relatório de Inflação, divulgado no fim de março pelo Banco Central, a autoridade monetária manteve a previsão de que o IPCA termine 2024 em 3,5%. A estimativa, no entanto, foi divulgada antes da alta do dólar e das enchentes no Rio Grande do Sul. O próximo relatório será divulgado no fim de junho.

As previsões do mercado estão mais pessimistas. De acordo com o boletim Focus, pesquisa semanal com instituições financeiras divulgada pelo BC, a inflação oficial deverá fechar o ano em 3,96%, abaixo portanto do teto da meta. Há um mês, as estimativas do mercado estavam em 3,8%.

A redução da taxa Selic ajuda a estimular a economia. Isso porque juros mais baixos barateiam o crédito e incentivam a produção e o consumo. Por outro lado, taxas mais baixas dificultam o controle da inflação. No último Relatório de Inflação, o Banco Central aumentou para 1,9% a projeção de crescimento para a economia em 2024.

O mercado projeta crescimento um pouco melhor. Segundo a última edição do boletim Focus, os analistas econômicos preveem expansão de 2,08% do PIB em 2024.

A taxa básica de juros é usada nas negociações de títulos públicos no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic) e serve de referência para as demais taxas de juros da economia. Ao reajustá-la para cima, o Banco Central segura o excesso de demanda que pressiona os preços, porque juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança.

Ao reduzir os juros básicos, o Copom barateia o crédito e incentiva a produção e o consumo, mas enfraquece o controle da inflação. Para cortar a Selic, a autoridade monetária precisa estar segura de que os preços estão sob controle e não correm risco de subir.

Mais do que o resultado, a grande expectativa dos agentes econômicos era sobre o placar da decisão, sobretudo após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomar a ofensiva contra o BC e o presidente da instituição, Roberto Campos Neto. A votação unânime agrada o mercado, depois da forte divisão da reunião de maio.

Na ocasião, cinco diretores herdados do governo Jair Bolsonaro votaram pela redução da Selic em 0,25 ponto porcentual, enquanto os quatro indicados por Lula votaram por uma queda maior, de 0,5 ponto. O racha levantou suspeitas de que poderia haver uma divisão política dentro do Copom e gerou ruídos no mercado – o que contribuiu para a piora das expectativas e para uma alta expressiva do dólar nas últimas semanas.

A expectativa sobre o placar desta reunião escalou após declarações de Lula na terça-feira, 19, em entrevista à CBN. Ele disse que o chefe da autoridade monetária não demonstra capacidade de autonomia, tem lado político e trabalha para prejudicar o País.

O presidente afirmou que hoje o Brasil vive um cenário que exige juros mais baixos para convencer os empresários a investir no País e comparou Campos Neto com o ex-juiz Moro, ao dizer que o chefe do BC tem mesmo papel, “com rabo preso a compromissos políticos”.

No comunicado da decisão, o Copom reiterou que os juros terão de continuar em nível restritivo. “A política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação, como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, diz o texto.

Segundo o Copom, “eventuais ajustes futuros” na taxa básica de juros serão ditados pelo “firme compromisso” de convergência da inflação à meta. O comitê reiterou que, diante de um processo de desinflação mais lento, da desancoragem das expectativas e do cenário global desafiador, é necessário ter “serenidade e moderação na condução da política monetária.”

O País segue em segundo lugar no ranking mundial dos juros reais (descontada a inflação à frente). Segundo levantamento do site MoneyYou com 40 economias, o Brasil passa a ter uma taxa de juros real de 6,79%, apenas atrás da Rússia (8,91%). Em terceiro, aparece o México (6,52%).

A média das 40 economias pesquisadas é de 0,36%. Até a informação mais recente divulgada pelo BC, o juro neutro brasileiro, que não estimula nem contrai a economia e, consequentemente, não acelera nem alivia a inflação brasileira, era estimado pela instituição em 4,5%. Em reunião do mercado com o BC no início deste mês, economistas cogitaram a possibilidade de o juro real neutro já estar próximo da casa de 6%.