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Comissão de Inquérito diz que Síria foi totalmente abandonada após terremoto

Segundo a comissão, o governo da Síria levou uma semana inteira para permitir o acesso à ajuda transfronteiriça.

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14 de março de 2023
Vinicius Palermo
Comissão de Inquérito diz que Síria foi totalmente abandonada após terremoto
Na avaliação do grupo, a resposta aos recentes terremotos foi caracterizada por problemas que impediram a entrega de ajuda urgente e vital para o noroeste da Síria.

A Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria avalia que as Nações Unidas, o governo sírio e outras partes são responsáveis por atrasos na entrega de ajuda de emergência aos sírios após o terremoto do mês passado.

O presidente da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre o país, o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, cita falhas como graves, destacando a demora na chegada de resposta aos tremores.

“A primeira constatação é que a comunidade internacional, inclusive os órgãos das Nações Unidas, não foram capazes na Síria de imediatamente atender as vítimas. Durante três dias não houve e não aconteceu nada. A Síria foi totalmente abandonada. Os esforços foram feitos pela própria população. Depois de sete dias tendo o governo da Síria autorizado mais duas passagens na fronteira, melhorou, mas se perderam dias preciosos”

Segundo a comissão, o governo sírio levou uma semana inteira para permitir o acesso à ajuda transfronteiriça. As autoridades sírias e grupos opositores impediram a chegada de ajuda às comunidades afetadas.

Na avaliação do grupo, a resposta aos recentes terremotos foi caracterizada por problemas que impediram a entrega de ajuda urgente e vital para o noroeste da Síria.

Para eles, essas falhas envolveram o governo e outras partes no conflito, bem como a comunidade internacional e as Nações Unidas.

Paulo Sério Pinheiro destaca a falha em garantir um acordo de cessar-fogo e a demora em viabilizar chegada de ajuda pela rota disponível, incluindo equipes de resgate e equipamentos na primeira semana vital após o terremoto.

“O outro desastre foi que o conflito continuou. Nossa primeira manifestação da comissão, logo depois do terremoto, era que era preciso um cessar fogo imediato, mas não ocorreu. As partes no conflito continuaram seus ataques. Quer dizer, trazendo mais uma camada de sofrimento da população. E a crise humanitária que já existia foi agravada com o terremoto e depois em cima do terremoto, não houve nenhuma suspensão das hostilidades. Então, isso é que nós achamos que é preciso: que a comunidade internacional trabalhe diretamente e intensamente sobre a possibilidade de um cessar fogo.”

O texto adiciona que os sírios se sentiram abandonados e negligenciados por aqueles que deveriam protegê-los, nos momentos mais desesperadores. Pinheiro avalia que houve uma falha da diplomacia.

“Nós mesmos dissemos em certo momento que era abominável fazer depender a vinda dos circuitos de ajuda humanitária de uma resolução do Conselho de Segurança. Nós esperamos que isso não se repita. Agora, a nossa grande esperança é que esses quase 12 anos de conflito são uma falência gritante da diplomacia e está no momento que a diplomacia internacional possa retomar uma luta comum por um cessar-fogo, porque é a única maneira de poder garantir uma ajuda humanitária necessária à população civil.”

A Comissão de Inquérito da ONU sobre a Síria lança seu último relatório pouco antes do 12º aniversário da crise.

A nova publicação documenta violações contínuas dos direitos humanos e do direito humanitário em todo o país nos últimos seis meses de 2022, incluindo a situação particularmente terrível para Sírios ao longo das linhas de frente no norte e noroeste.

Para Pinheiro, os sírios agora precisam de um cessar-fogo abrangente que seja totalmente respeitado, para que os civis, incluindo trabalhadores humanitários, estejam seguros.

Ele afirma que “devido à crueldade e cinismo das partes em conflito”, novos ataques estão sendo investigados nas áreas que foram atingidas pelos terremotos”. O especialista brasileiro cita um ataque israelense relatado na semana passada ao aeroporto internacional de Aleppo, um canal para ajuda humanitária.

Comunidades inteiras foram destruídas e a ONU estima que cerca de 5 milhões de pessoas precisam de abrigo básico e assistência não alimentar na parte síria da zona do terremoto.

Já antes dos terremotos de 6 de fevereiro, mais de 15 milhões de sírios, mais do que em qualquer momento desde o início do conflito, precisavam de assistência humanitária.

O relatório aponta que as partes em conflito na Síria cometeram violações e abusos generalizados dos direitos humanos nos meses que antecederam os terremotos que atingiram a região no último mês.

Em áreas controladas pelo governo, a comissão documentou o aumento da insegurança em Dara’a, Suwayda’ e Hama, e a continuação de prisões arbitrárias, tortura, maus-tratos e desaparecimentos forçados. As violações dos direitos de propriedade incluíam apreensões, leilões e proibições de acesso à propriedade.

A comissão apresentará as conclusões ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra na próxima terça-feira.

Os civis que vivem no noroeste afetado pelo terremoto foram particularmente expostos a ataques mortais nos meses anteriores.

Em um único ataque indiscriminado em novembro, as forças do governo usaram munições de fragmentação para atacar campos de refugiados densamente povoados na província de Idlib, dentro da área controlada pela oposição. No ato morreram sete civis e mais 60 podem ter fiado feridos.

Em agosto, outro ataque envolvendo foguetes não guiados lançados do solo matou 16 civis e feriu 29 em um movimentado mercado em Al-Bab, a nordeste de Aleppo.

Em julho, ataques aéreos das Forças Aeroespaciais da Federação Russa destruíram uma casa civil em Judaydah, Jisr Shughour matando sete membros de uma família e ferindo 13 outros civis.

Segundo o relatório, a violência aponta para um padrão há muito estabelecido de ataques indiscriminados, que podem equivaler a crimes de guerra.

Além disso, a comissão constatou que ainda não existem condições para o retorno seguro e digno. Durante o período do relatório, há relatos de sírios que tiveram pedidos negado, foram arbitrariamente presos ou impedidos de acessar suas casas após retornarem a áreas controladas pelo governo.

Além disso, grupos armados nas áreas afetadas pelo terremoto têm restringido regularmente os direitos de mulheres e meninas.

Segundo os autores, a maioria dos desabrigados nessas áreas são meninas e mulheres, muitas delas chefes de família. Assim, o relatório aponta que a ampliação da ajuda deve levar em consideração o impacto de gênero da crise.

A comissão apoia os pedidos das famílias para que uma entidade internacional independente apoie a busca pelos desaparecidos e pelas famílias dos sobreviventes e celebra os primeiros passos nessa direção.

No final deste mês, o secretário-geral da ONU, António Guterres, deve informar a Assembleia Geral da ONU sobre a questão das pessoas desaparecidas na Síria.

Para o grupo, governo e outras partes no conflito prolongaram deliberadamente o sofrimento de centenas de milhares de familiares ao reter informações sobre o destino dos desaparecidos ou desaparecidos por muito tempo.

O alto comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, concluiu uma visita de cinco dias às áreas arrasadas pelo terremoto da Síria e Turquia. Ele visitou sobreviventes e pessoas afetadas, bem como equipes humanitárias no local, prestando apoio urgente às pessoas necessitadas.

O terremoto matou 54 mil pessoas nos dois países e causou destruição em massa em uma área com mais de 23 milhões de habitantes, incluindo muitos que foram deslocados na Síria ou através da fronteira para Turquia como refugiados durante 12 anos de conflito.

Ao avaliar os danos, Grandi também revisou e discutiu a resposta humanitária imediata com as autoridades dos dois países. Além de Ancara, o chefe do Acnur visitou Hatay e Gaziantep na Turquia.

Na Síria, ele esteve em Latakia, Hama e Damasco e realizou uma visita transfronteiriça a pessoas afetadas pelo terremoto e outras pessoas deslocadas no noroeste da Síria

A ONU pediu US$ 1 bilhão para a resposta humanitária ao terremoto em Turquia e quase US$ 400 milhões para a Síria.