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Campos Neto reforça que não há reversão fiscal no mundo pós-pandemia

Ele reforçou que não houve uma reversão dos gastos criados para combater os efeitos da covid-19, o que é um problema quando se considera os desafios à frente.

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21 de outubro de 2024
Vinicius Palermo
Campos Neto reforça que não há reversão fiscal no mundo pós-pandemia
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, repetiu nesta segunda-feira, 21, que existe uma preocupação com o nível de endividamento do mundo, que cresceu substancialmente durante a pandemia. Ele reforçou que não houve uma reversão dos gastos criados para combater os efeitos da covid-19, o que é um problema quando se considera os desafios à frente.

“Acho que o mundo tem muitas contas a pagar, em termos de custos, temos a transição verde, geopolítica, o grande custo da desigualdade que foi gerado durante a pandemia”, disse, em um evento da 20-20 Investment Association, em São Paulo. “Ainda que os efeitos da pandemia estejam diminuindo, não vimos uma reversão no front fiscal.”

Em alguns locais do mundo, ele notou, houve uma “pequena reversão” na política fiscal. Mas, como regra geral, ela continua descolada da política monetária, após um momento de boa coordenação durante a pandemia. Campos Neto também repetiu que os países ricos gastaram mais do que os países de renda baixa durante a pandemia.

O presidente do BC ainda voltou a dizer que a inflação vem mostrando notícias positivas globalmente, com alguma convergência, inclusive dos núcleos, para as metas perseguidas pelos bancos centrais. Reforçou, ainda, que a inflação de serviços tem sido o maior problema globalmente, ligada ao forte desempenho do mercado de trabalho, que está forte também no Brasil.

O presidente do Banco Central repetiu que a China tem mudado o seu modelo econômico, do consumo interno para a exportação de produtos ligados à eletrificação, mas tem enfrentado restrições de diversos países, que tentam combater a proliferação de bens com origem no país, como carros elétricos.

“Eu tenho um texto longo aqui, e vocês não precisam ler tudo, mas é basicamente para dizer que de duas em duas semanas um novo país coloca uma nova restrição, uma nova medida”, disse.

Essa proliferação de restrições, ele disse, indica que esse modelo chinês é desafiador. O presidente do BC voltou a citar estudos que falam sobre os impactos que novos impostos sobre importações nos Estados Unidos teriam no crescimento do PIB da China e no americano.

Ele repetiu que as propostas em discussão na eleição americana, por ambos os candidatos, indicam uma inflação mais alta por razões como protecionismo comercial e expansão fiscal.

O presidente do Banco Central disse ainda que a inflação do Brasil tem seguido um processo de convergência, mas citou preocupações com a desancoragem das expectativas e de métricas como as inflações implícitas no mercado. Ele reforçou que a autarquia vai perseguir a meta de inflação.

“Porque vimos essa grande desancoragem, porque vimos muitas das coisas já mencionadas aqui, o Banco Central decidiu que era hora de começar o ciclo de aperto”, disse Campos Neto. “Nós achamos que é muito importante fazer a inflação convergir, é o nosso trabalho.”

Ele repetiu que o crescimento da economia brasileira tem surpreendido e que parte desses bons resultados parecem refletir a expansão fiscal. Em contrapartida, os repetidos resultados positivos do mercado de trabalho também indicam alguma mudança mais estrutural, possivelmente refletindo as reformas aprovadas nos últimos anos, afirmou.

“Quando você olha para o rendimento real e para tudo que realmente pode nos dizer um pouco sobre o que será o cenário para a inflação de serviços, os números são preocupantes”, ele disse. “Estamos observando isso de perto e decidimos não dar um guidance para a próxima reunião, porque queríamos ter tempo de analisar o cenário.”

O presidente do Banco Central voltou a defender que a autarquia passe a ter autonomia financeira. Ele voltou a citar notas do seu avô, Roberto Campos, defendendo que o BC precisaria de três dimensões de autonomia para ser independente.

“Você precisa ter autonomia operacional, você precisa ter autonomia administrativa, e você precisa ter autonomia financeira. E ele tinha uma nota abaixo disso, dizendo que o risco de não ter uma é acabar com nenhuma”, afirmou Campos Neto. “Às vezes, se você tem autonomia operacional, mas não tem autonomia financeira, você pode ficar asfixiado na parte financeira.”

Ele repetiu que a aprovação da autonomia operacional do BC foi um ganho importante inclusive para que a autoridade monetária pudesse aumentar os juros em um ano eleitoral.

O presidente do Banco Central disse que as despesas de governos com seguridade social têm aumentado no mundo todo, refletindo o envelhecimento da população. Por isso, ele argumentou, é necessário avançar em reformas que aumentem a produtividade.

“Nós seremos capazes de ser mais produtivos? O que vejo hoje é que não estamos nos tornando mais produtivos neste momento, mas há muitas novas tecnologias surgindo, e pode ser que isso ocorra”, afirmou.

Respondendo a uma pergunta sobre como escapar da armadilha da renda média, o presidente do BC destacou que, partindo do princípio que qualquer aumento de produtividade virá da adoção de novas tecnologias, isso vai aumentar a distância entre países ricos e em desenvolvimento.

“A verdadeira pergunta é: seremos capazes de ser mais produtivos? Para isso, vamos precisar de reformas no lado da oferta”, disse Campos Neto, reiterando que o Brasil aprovou algumas reformas desse tipo durante a pandemia, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, como com a aprovação da lei de liberdade econômica.

O presidente do Banco Central disse que a instituição não tem o objetivo de diminuir a circulação de moeda, mas encara esse resultado como um processo natural. À medida que a tecnologia avança na intermediação financeira, a tendência é que o uso de dinheiro físico diminua.

Ele disse que parte da população, especialmente nas classes D e E, ainda recebe os salários em dinheiro, mas tem se bancarizado por causa do Pix. “Não é nosso objetivo não ter dinheiro. Nosso objetivo é ter mais opções para as pessoas fazerem coisas de forma mais barata, mais segura e mais competitiva”, afirmou.