Economia
Energia sustentável

Campos Neto: Brasil é excelente candidato a receber investimentos externos

O presidente do BC ponderou ainda que há uma melhora estrutural na balança comercial brasileira, devido ao aumento da exportação de petróleo e de alimentos.

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08 de junho de 2024
Vinicius Palermo
Campos Neto: Brasil é excelente candidato a receber investimentos externos
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que o Brasil continua sendo um “excelente candidato” a receber investimentos externos. A posição forte na área de energia sustentável favorece o País como um recebedor de recursos, embora a entrada de verba via nearshoring e friendshoring esteja ficando abaixo do esperado, ele afirmou.

“A gente tem alguma coisa, mas a gente esperava que fosse ser bem maior”, comentou Campos Neto, em um evento da Monte Bravo Investimentos, em São Paulo. “Quando a gente fala com as empresas, essa parte de realocação, near shoring e friend shoring, não está se desenvolvendo no ritmo em que a gente esperava.”

Ele ponderou ainda que há uma melhora estrutural na balança comercial brasileira, devido ao aumento da exportação de petróleo e de alimentos. “Nessa base de comércio internacional, o Brasil tem um patamar hoje que é diferente do passado, você tem uma solidez em termos de balanço externo”, afirmou.

Sobre e saída de capitais do País, Campos Neto disse que parte desse movimento se deve ao aumento da preocupação fiscal. Quando o mundo começa a debater a dívida de vários países, é mais importante fazer o dever de casa no País. Além disso, programas que geram gastos governamentais parecem agora ter menos aceitabilidade no futuro, disse.

Outra razão se deve aos juros altos no mundo desenvolvido, segundo o presidente do BC. “Você hoje pode entrar em uma agência de private banking nos Estados Unidos e comprar um produto ligado ao Treasury de cinco anos, que te paga 8,5%, 9%. É bastante taxa, com alguma alavancagem, mas ligada ao risco do Tesouro Americano”, exemplificou.

Campos Neto aproveitou para dizer que considera possível que haja uma recessão global, mas ponderou que ela não deve gerar uma ruptura nos mercados.

O presidente do Banco Central também afirmou que o mercado de crédito tem crescido bastante, de forma saudável, com uma segmentação importante, já que a parte de mercado de capitais tem apresentado um bom crescimento, especialmente em renda fixa. O banqueiro central observou que, embora no ano passado agentes tenham ficado preocupados com a possibilidade de esse mercado colapsar, “nada disso aconteceu”, inclusive com a emissão de debêntures voltando agora a níveis recordes.

“Parte de mercado de capitais crescendo muito, principalmente renda fixa, com performance ruim de renda variável. Escutei muito no ano passado que mercado ia colapsar, nada disso aconteceu, teve período que emissão de debênture foi um pouco menor, mas já voltou a níveis recordes. Condições financeiras estão mostrando que temos aperto monetário, mas que tem pedaço do mercado de capitais que está funcionando muito bem”, disse Campos Neto.

Sobre o mercado de trabalho, ele voltou a dizer que há uma melhora sob “todas as óticas”, além do imaginado e, que, mesmo que isso seja apontado como um risco, não foi identificada até o momento uma relação mecânica entre esse aquecimento e a inflação de serviços.

“Quando olha a massa real salarial subindo, olha também um pouco efeito no consumo de famílias, ver o que é transferência de governo, o que é salário de fato que está aumentando na ponta, olha os acordos coletivos para tentar ver tendência”, citou Campos Neto.

O presidente do Banco Central destacou também que o mercado de trabalho global tem surpreendido para cima, observando ainda que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) não comprou totalmente a ideia de que um ganho da produtividade aqueceu esse segmento.

“Mercado de trabalho global tem surpreendido bastante para cima. Tem olhado a parte de custo unitário, as tendências em termos de salário, o que é real, produtividade. Acho que se consegue defender um tema de produtividade nos EUA, apesar de Fed não comprar 100% essa ideia”, disse.

Ele ainda voltou a dizer que, no pós-pandemia, o tempo de rearrumação das cadeias contribui para a visão de que a inflação seja um “pouquinho” mais alta por mais tempo, levando os juros também a patamares mais altos por mais tempo.

Campos Neto explicou que, embora o near shoring tenha ganhado destaque nos últimos anos, a realocação de cadeias custa caro num primeiro momento, assim como a transição das empresas para práticas mais sustentáveis, gerando uma pressão na parte de produção.

“Se de um lado vimos pressão de custo de salário e pressão na parte imobiliária, e de macro, do outro lado também via pressão na parte de produção. Também vê um pouco que o que cresce em exportações globais é basicamente a parte de serviços digitais, e o resto em crescimento bem aquém do que tínhamos projetado (em comercio global)”, disse ele.

O presidente do Banco Central destacou ainda o aumento de restrições comerciais a produtos vendidos pela China, o que tem consequências para o Brasil, em especial no mercado automotivo. “Tem a China tentando trazer o maior número de carros para cá porque alguns mercados estão se fechando”, disse.
Campos Neto apontou que esse cenário de restrições ao mercado chinês é um ponto muito discutido, pelas eventuais consequências que isso pode ter na economia do país, já que há um volume de recursos grande direcionado à produção para exportação, enquanto países têm fechado algumas portas para as mercadorias do gigante asiático.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, voltou a falar que a desindexação do Orçamento federal seria um passo importante, com choques positivos no contexto do futuro do arcabouço fiscal. Campos Neto citou a discussão ao mencionar que existe um “grande questionamento” do mercado sobre a consistência das novas regras fiscais ao longo do tempo.

“Temos falado bastante, o governo fez esforço enorme com arcabouço, passou várias medidas no Congresso. Existe um questionamento grande sobre a consistência ao longo do tempo do arcabouço criado. Vi recentemente o governo falando em tentar endereçar essas inconsistências – por exemplo (mudar) a vinculação de saúde e educação, indexação do salário mínimo – com bons olhos, seria um choque positivo importante se pudesse ser feito”, repetiu.

O banqueiro central também lembrou que os questionários pré-Copom mostraram uma piora da percepção dos agentes sobre a situação fiscal, embora a piora numérica na Focus tenha sido pequena.
“O que os agentes econômicos fazem é tentar estimar como vai ser essa convergência dessa dívida para frente. Quando se olha os questionários, apesar de não ter visto piora numérica no Focus, teve até uma pequena, 79% dos agentes acham que a situação fiscal piorou. Então imagina que isso pode ter explicado parte desse aumento do prêmio de risco na parte longa”, disse ele.

Campos Neto ainda comentou sobre a taxa de juros real, que é classificada por muitos no Brasil como muito alta, mas observou que o Brasil tem melhorado sua posição na comparação com outros ciclos econômicos, reduzindo a posição em relação a outros países.

Ele defendeu também que é importante pensar no esforço monetário – traduzido pela diferença entre a taxa de juros real e a taxa de juros real neutra. “Quando se faz essa comparação, vemos que o Brasil não está na ponta de cima, está mais na ponta de baixo”, disse.

O presidente do Banco Central voltou a dizer que não tem planos fechados para depois de 2024. O mandato dele à frente da autoridade monetária termina no dia 31 de dezembro. A partir do ano que vem, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, deve indicar outro nome para substituí-lo.

“Todo dia eu leio um plano novo no jornal ou, às vezes, minha esposa vem falar: ‘li aqui um negócio, de que vai fazer isso.’ Eu sempre fico surpreendido, porque eu não tenho plano nenhum”, afirmou Campos Neto, durante um evento da Monte Bravo Corretora, em São Paulo. “A única coisa que posso garantir é que vou dar um descanso durante um tempo.”

Antes de encerrar a participação no evento, Campos Neto completou: “Uma coisa que posso dizer para vocês é que vocês não sabem o quanto abre a sua mente quando você não tem de ficar olhando para uma telinha com preço subindo e caindo o dia inteiro.”

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reforçou ainda que existem dúvidas sobre o impacto da calamidade no Rio Grande do Sul para a atividade econômica do País, cuja expectativa de crescimento foi revisada pela instituição para 1,9% no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) de março. As incertezas pairam especialmente para o segundo trimestre, pontuou Campos Neto, observando ainda que existe uma oscilação em termos de expectativa.

“Temos visto oscilação grande em termos de expectativa, não só no custo de reconstrução mas também no impacto de crescimento, então estamos nos aprofundando um pouco nisso. Vai ter esse elemento incerteza de curto prazo, e precisa entender como isso vai se dar mais ao médio prazo, qual tipo de reconstrução”, disse Campos Neto, lembrando que o PIB gaúcho representa 6,5% do PIB brasileiro.
O presidente do Banco Central apontou que a autoridade monetária percebeu em estudos recentes que, na relação de eventos por anomalias climáticas, os acontecimentos com enchentes são os que mais crescem.

O apontamento foi feito enquanto Campos Neto indicava os dados históricos da inflação, contextualizando o que aconteceu na pandemia, quando o índice passou a subir em países desenvolvidos, que, à época, não acreditavam que o fenômeno poderia ser permanente.
Lá, lembrou o presidente do BC, a inflação foi em grande parte puxada por energia e alimentos, momento em que os banqueiros centrais tiveram dificuldade de fazer um diagnóstico do avanço de preços, por estarem pouco acostumados – diferente do Brasil, que já estaria mais preparado para enfrentar a alta inflacionária por experiências prévias. Nos países emergentes, disse Campos Neto, os alimentos tiveram um peso maior na inflação do que a energia.

Para Campos Neto, o aprendizado do período foi o entendimento de que, a partir de um nível de difusão, a inflação se torna muito mais permanente, o que acabou sendo percebido nos países desenvolvidos.
Agora, os eventos mais recentes em relação a preço de alimentos estão relacionados a questões climáticas, observou o banqueiro central. “O que tem acontecido mais recente em preço de alimentos, com anomalia climática, os eventos acontecem com maior frequência e intensidade”, disse.