Economia
Risco do crédito

BC admite que preços de ativos não preocupam no médio prazo

O BC reconheceu que o endividamento das famílias seguem elevados e que a capacidade de pagamento de dívidas das empresas diminuiu.

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09 de março de 2023
Vinicius Palermo
BC admite que preços de ativos não preocupam no médio prazo
Com relação às empresas de menor porte, o comitê do BC considerou que houve desaceleração no ritmo de crescimento do crédito.

O Banco Central (BC) afirmou na ata do Comitê de Estabilidade Financeira (Comef), realizada na semana passada, que os preços dos ativos e o crescimento do crédito não representam preocupação no médio prazo, mas ponderou que há incertezas a serem acompanhadas.

Segundo o comitê, desde a última reunião, em novembro, o crescimento do crédito desacelerou nas diversas modalidades e, na margem, as operações nas linhas de maior risco vêm sendo originadas com melhor qualidade de crédito. Mas, por outro lado, o BC reconheceu que o endividamento e o comprometimento de renda das famílias seguem elevados, e que a capacidade de pagamento de dívidas das empresas diminuiu.

Em relação às concessões, o BC afirmou que o apetite ao risco das IFs na concessão de crédito às famílias e às empresas de menor porte apresentou redução, porém permanece elevado, especialmente em linhas de maior risco, como cartão de crédito e crédito não-consignado. Com relação às empresas de menor porte, o comitê considerou que houve desaceleração no ritmo de crescimento do crédito, mas não se percebe alteração relevante nos critérios de concessão.

Nesse contexto, o comitê afirma que uma frustração substancial do desempenho da atividade econômica pode resultar em elevação do risco de crédito e segue recomendando que as instituições financeiras mantenham a prudência na política de gestão de crédito e de capital.

Em relação à situação atual do Sistema Financeiro Nacional (SFN), o colegiado citou ainda que o resultado dos testes de estresse demonstra que o sistema está resiliente. “Nos cenários de estresse macroeconômico avaliados, descritos no Relatório de Estabilidade Financeira, o sistema não apresentaria desenquadramentos relevantes”, disse o BC na ata do Comef. “Teste de análise de sensibilidade verificou que mesmo que os ativos problemáticos dobrassem em relação a seus níveis atuais, o sistema não apresentaria desenquadramentos relevantes.”

Mas a autarquia afirmou que a elevação da incerteza ampliou o impacto no sistema. Nesse caso, o impacto mais severo continua sendo o observado no cenário de quebra de confiança no regime fiscal.

Em relação aos níveis de capitalização e de liquidez, houve manutenção em níveis superiores aos requerimentos prudenciais, segundo o Comef. “O sistema tem mantido capital e ativos líquidos suficientes para absorver potenciais perdas em cenários estressados e cumprir a regulamentação vigente.”

O comitê segue atento, contudo, à dinâmica de resgates das cadernetas de poupança e seus efeitos nas concessões de crédito imobiliário. “A rentabilidade do SFN recuou devido, sobretudo, ao aumento das despesas com provisões, e permanece pressionada por redução da margem de crédito, baixo crescimento das receitas de serviço e crescimento das despesas administrativas devido à inflação.”

Por fim, o Comef afirmou que está atento à evolução dos cenários doméstico e internacional e segue preparado para atuar, minimizando eventual contaminação desproporcional sobre os preços dos ativos locais. “O Comitê segue entendendo que políticas macroeconômicas que aumentem a previsibilidade fiscal, que reduzam os prêmios de risco e a volatilidade dos ativos contribuem para a estabilidade financeira e, consequentemente, melhoram a capacidade de pagamento dos agentes.”

O Banco Central avaliou, na ata do Comef, que, mesmo em um cenário extremo, o impacto futuro do caso Americanas sobre o SFN é insignificante. No documento, o regulador não cita o nome da varejista, mas cita um “evento específico relacionado à empresa de grande porte”.

“O Banco Central estimou o impacto potencial remanescente, acrescido de um cenário de contágio sobre toda a cadeia de produção e fornecimento que depende da empresa de forma relevante. Nesse cenário extremo, o impacto para o SFN consolidado é insignificante e não se verificaria desenquadramento de capital em qualquer instituição financeira”, destacou na ata do Comef.

Segundo o comitê, parcela significativa das provisões realizadas nos balanços das instituições financeiras no último trimestre de 2022 decorreu desse “evento específico” e já absorveram a maior parte da materialização do risco. O Comef ainda considerou que as provisões por esse caso responderam por parte relevante do recuo anual da rentabilidade do SFN.

No documento, o colegiado considerou que o aumento das provisões foi condizente com a maior materialização do risco no período. Além dos casos pontuais com empresas de maior porte, o Comef citou o crescimento do crédito em modalidades mais arriscadas, o aumento do comprometimento de renda das famílias e a redução da capacidade de pagamento de micro e pequenas empresas para o avanço da materialização do risco.

“A materialização de risco deve permanecer elevada no médio prazo, mas critérios mais restritivos nas concessões recentes têm colaborado para arrefecer o crescimento dos ativos problemáticos no crédito às famílias.”

Ainda sobre o caso Americanas, o BC disse também, sem citar o nome da empresa, que eventos pontuais em empresas de grande porte geraram uma deterioração nos preços de ativos no mercado de títulos privados.

Após o rombo bilionário da Americanas, veio a público outros casos de problemas em varejistas. “Em decorrência desses eventos pontuais, a volatilidade, os spreads e a aversão ao risco aumentaram. Também foram observados efeitos em algumas linhas no mercado de crédito.”

O comitê disse que acompanha os desdobramentos dos “eventos recentes” sobre os prêmios de risco no mercado de capitais. Segundo o regulador, o Comef acompanha a evolução e os desdobramentos dos eventos recentes e segue pronto para atuar em caso de disfuncionalidade.

Também na ata da reunião do Comef, o Banco Central afirmou que o cenário global apresentou acomodação desde o encontro anterior, em novembro, mas ponderou que houve alguma reversão em fevereiro “O processo de desinflação global segue desafiador e os dados recentes de atividade consolidam um cenário global de aperto monetário mais prolongado”, disse o BC, no documento.

Segundo o regulador, a possibilidade de mudanças mais abruptas na condução da política monetária aumenta o risco de materialização de cenários extremos de reprecificação de ativos financeiros. “A frustração das expectativas de queda da inflação nas economias centrais eleva a incerteza sobre os cenários prospectivos, acentuando a volatilidade nos mercados e propiciando a ocorrência de eventos de estresse, com implicações globais.”

Em relação aos emergentes, contudo, o Comef considerou, que, até o momento, têm mostrado resiliência diante do forte aperto das condições financeiras observado desde o final de 2021. Mas o comitê ponderou que os elevados níveis de endividamento público resultantes dos esforços de combate aos efeitos da pandemia de covid-19 sobre a economia são um fator de vulnerabilidade. “A transparência, previsibilidade e credibilidade na condução das políticas monetária, fiscal e macroprudencial são essenciais para mitigar os riscos sistêmicos.”