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Aras chama de ‘ressentido’ procurador que o associou ao 8 de janeiro

Segundo Aras, as acusações “já foram encaminhadas à Corregedoria do Ministério Público para as providências cabíveis”.

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17 de fevereiro de 2024
Vinicius Palermo
Aras chama de ‘ressentido’ procurador que o associou ao 8 de janeiro
O ex-procurador-geral da República Augusto Aras

O ex-procurador-geral da República Augusto Aras disse que a manifestação da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão que sugeriu que ele contribuiu para o avanço de atos antidemocráticos enquanto estava no cargo “não passa de uma opinião ressentida”.

Segundo Aras, as acusações “já foram encaminhadas à Corregedoria do Ministério Público para as providências cabíveis”. O ofício assinado pelo procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes cita decisões de Aras que teriam atrapalhado o combate às articulações antidemocráticas.

Aras alega que a manifestação do procurador se deu por ele estar “ainda inconformado” com suas decisões “contrárias ao repasse de R$ 2,3 bilhões de um acordo de leniência para a Transparência Internacional, uma ONG alemã”. Aras faz menção ao acordo de leniência do grupo J&F e à intenção de criação de uma fundação para gerenciar parte do valor, que teria como destino a execução de projetos sociais nas áreas da educação, da saúde, do meio ambiente, do fomento à pesquisa e da cultura.

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou em decisão do dia 5 de fevereiro deste ano que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue a atuação da ONG Transparência Internacional no Brasil. De acordo com a decisão, a ONG chegou a ser designada como responsável por administrar a aplicação desses R$ 2,3 bilhões em investimentos sociais previstos no acordo de leniência da J&F no âmbito da Lava Jato.

Consta ainda da decisão de Toffoli uma manifestação da PGR que indica que, ainda em 2019, a própria procuradoria-geral (à época sob a então procuradora-geral Raquel Dodge) questionou a legalidade da criação de uma fundação nesses moldes. A manifestação foi acatada por decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes. A Transparência Internacional informou, por nota, que não recebeu ou gerenciou valores do acordo.

Em 2020, Aras emitiu um ofício em que pede o bloqueio do repasse de R$ 270 milhões do acordo de leniência da J&F para a Transparência Internacional. A ONG, à época, negou que recebeu ou receberia o valor.

A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão sugeriu que, enquanto esteve no cargo, o ex-procurador-geral da República Augusto Aras contribuiu para o avanço de atos antidemocráticos.
O documento da Procuradoria cita três decisões de Aras que frearam iniciativas de membros do Ministério Público Federal no encalço das articulações antidemocráticas.

Em dezembro de 2022, ele barrou o envio de uma recomendação, preparada pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, para que a Polícia Federal, a Polícia Militar do Distrito Federal, o Comando Militar do Planalto e a Secretaria de Segurança Pública do DF monitorassem em conjunto os acampamentos bolsonaristas e fizessem o possível para coibir manifestações violentas.

Na época, a justificativa dada pelo então procurador-geral foi a de que a iniciativa de notificar as autoridades extrapolava as atribuições da Procuradoria dos Direitos do Cidadão. Os acampamentos foram posteriormente apontados pela PF como um dos focos da articulação do 8 de janeiro.

Antes disso, em novembro de 2022, Aras já havia acabado com grupos de trabalho descentralizados e dedicados ao combate aos atos antidemocráticos no Ministério Público Federal, que foram substituídos por uma comissão diretamente ligada ao PGR.

Por fim, o documento cita a decisão que impediu o compartilhamento, com procuradores do Rio, de provas sobre investigações de atos antidemocráticos. Aras ainda encaminhou o caso para apuração disciplinar.

“As mencionadas circunstâncias contribuíram para que o avanço das ações antidemocráticas ocorresse sem a coibição que exigia a ordem jurídica”, diz um trecho do ofício assinado pelo procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes.

O documento faz parte de um inquérito civil que investiga os atos antidemocráticos. Aras não é investigado no caso. Qualquer apuração sobre a conduta do ex-procurador-geral depende do aval de seu sucessor, Paulo Gonet, que já foi notificado.