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Campos Neto: juro neutro é maior no mundo todo

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, repetiu que a dívida global cresceu muito e que a política fiscal está dissociada da política monetária desde o fim da pandemia.

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22 de outubro de 2024
Vinicius Palermo
Campos Neto: juro neutro é maior no mundo todo
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, repetiu que a dívida global cresceu muito e que a política fiscal está dissociada da política monetária desde o fim da pandemia.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse, em entrevista à CNBC, que há razões para pensar que a taxa neutra real de juros, que não estimula nem deprime a economia, subiu globalmente nos últimos anos. Ele citou, entre os fatores, o aumento da dívida mundial e os volumes de transferências do governo para pessoas.

“No caso dos Estados Unidos, é importante entender o jogo de expectativas e percepções, porque você não quer ficar à frente da curva e, então, ter de corrigir isso depois, porque o dano à credibilidade nesse ponto, com muita incerteza, pode ser grande demais”, ele disse, respondendo a uma pergunta sobre um movimento de “volta ao juro neutro” de outros bancos centrais.

Campos Neto repetiu que a dívida global cresceu muito e que a política fiscal está dissociada da política monetária desde o fim da pandemia.

O presidente do Banco Central disse ter uma visão “mais cética” sobre a capacidade de as eleições dos Estados Unidos influenciarem os mercados financeiros. Em entrevista à rede norte-americana CNBC, ele afirmou que esses efeitos podem ser mais limitados.

Campos Neto também voltou a dizer que as propostas em discussão nas eleições dos Estados Unidos – com aumento do protecionismo, combate à imigração e expansão fiscal – indicam uma inflação mais alta no país. Isso, ele afirmou, pode levar os juros americanos a estacionarem em um nível mais alto.

“Se esse for o caso, talvez os juros dos EUA não possam cair tanto quanto iriam. E, se esse for o caso, há um impacto para os mercados emergentes”, afirmou Campos Neto. “Pode impactar a maneira como os mercados emergentes lidam com seus próprios problemas, porque isso impacta o custo de financiamento globalmente.”

O presidente do Banco Central disse que a grande dúvida para o Brasil e os mercados emergentes é qual será o ritmo de crescimento estrutural da China no médio e longo prazo, e não no curto. Ele lembrou que há desafios ao modelo de exportação de itens ligados à eletrificação que o gigante asiático tenta emplacar.

“Isso está criando muita resistência de alguns outros países, e estamos vendo muitos países criando tarifas e colocando medidas contra a China”, afirmou Campos Neto. “A questão é: se esse é o caso, o que vai acontecer com o crescimento da China no médio prazo? É com isso que estamos mais preocupados.”

Na avaliação dele, os pacotes de estímulos discutidos são bons para endereçar os problemas de curto prazo, mas o crescimento estrutural da China é mais importante para países emergentes, como o Brasil.

O presidente do Banco Central voltou a defender a importância da independência da autoridade monetária em entrevista à rede norte-americana CNBC. Ele afirmou que dissociar o ciclo de política monetária do ciclo político fortalece a credibilidade das instituições.

“Quando você tem mais credibilidade, você tem menos prêmio de risco na sua curva de juros e você tem menos risco associado ao país. E, quando você tem isso, todas as outras políticas funcionam melhor”, afirmou Campos Neto, respondendo a uma pergunta sobre a “politização” da atividade dos bancos centrais no mundo.

Falando sobre o Brasil, Campos Neto lembrou que o BC, depois de conseguir a autonomia, elevou a Selic em ano eleitoral. “Esse foi o maior aumento de juros na história de mercados emergentes em um ano de eleições, e só foi possível porque tínhamos autonomia”, afirmou, repetindo que o BC agiu com independência nas eleições.

Quando indagado sobre a própria imparcialidade, por ter sido criticado por ligações com a direita no Brasil, Campos Neto disse que é importante diferenciar “proximidade” de dependência. Ele argumentou que, durante a sua gestão, teve de ser próximo de políticos para aprovar projetos de interesse do BC, mas agiu com independência.

“É muito difícil fazer projetos avançarem no Congresso se você não estiver lá para explicar aos políticos o que você está tentando fazer”, afirmou Campos Neto. “Uma coisa é ser próximo, e outra coisa é ter autonomia. Eu posso ser próximo de alguém e ter autonomia, ou posso ser distante e não ter autonomia.”