Economia
Recuperação desigual

IDH do Brasil volta a subir, mas polarização política atrapalha

A organização aponta que há recuperação global após a crise da covid-19, mas ainda de forma desigual e impactada pela “polarização política”.

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14 de março de 2024
Vinicius Palermo
IDH do Brasil volta a subir, mas polarização política atrapalha
O IDH varia de 0 a 1. Quanto mais próximo o índice estiver de 1, melhor a pontuação do país.

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil aumentou, passando de 0,754 para 0,760, patamar considerado elevado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), responsável pela divulgação do indicador. Os novos dados foram apresentados na quarta-feira, 13. A organização aponta que há recuperação global após a crise da covid-19, mas ainda de forma desigual e impactada pela “polarização política”.

O IDH varia de 0 a 1. Quanto mais próximo o índice estiver de 1, melhor a pontuação do país. Antes da pandemia, o IDH do Brasil chegou a 0,766, mas houve queda diante dos impactos socioeconômicos da pandemia. Agora, o patamar voltou a subir, sobretudo por conta do aumento da expectativa de vida.

Ainda assim, o País caiu duas posições no ranking global de desenvolvimento da ONU, passando de 87º, em 2021, para 89º, em 2022, dado mais recente disponível e último da gestão Jair Bolsonaro (PL).
O Brasil fica à frente de outros países sul-americanos, como Colômbia e Equador, mas atrás de vizinhos como Uruguai (58º) e Argentina (47º).

A média do indicador na América Latina é de 0,763, ligeiramente acima do brasileiro. O ranking é liderado por Suíça, Noruega e Islândia. Os EUA aparecem na 20ª colocação, enquanto a China em 75ª e a Índia, em 134º.

O IDH é uma medida do progresso a longo prazo em três dimensões básicas do desenvolvimento humano: renda, educação e saúde. A escala vai de 0 a 1, sendo que, quanto mais próximo o índice estiver de 1, melhor é a qualidade de vida naquela nação. Divulgado desde 1990, o relatório anual é uma das principais e mais influentes publicações da ONU.

As Nações Unidas destacam recuperação no período pós-pandemia, mas anda de modo muito desigual. “Todos os anos, alguns países diferentes apresentam quedas nos respetivos valores de IDH, no entanto, 90% dos países viram o seu valor de IDH cair quer em 2020 quer em 2021, excedendo largamente o verificado na sequência da crise financeira mundial”, afirma.

“O ano passado assistiu a alguma recuperação a nível mundial, mas foi parcial e desigual: a maioria dos países com IDH muito elevado registou melhorias, enquanto a maioria dos restantes registou declínios contínuos”, continua a entidade.

O estudo “Rompendo o Impasse: Reimaginando a cooperação em um mundo polarizado”, traz a classificação atualizada de 191 países com base no Rendimento Nacional Bruto per capita, educação e expectativa de vida.

Os três países no topo do Índice de Desenvolvimento Humano são Suíça, Noruega e Islândia. Dentre os países lusófonos, Portugal é o único no grupo com desenvolvimento humano considerado muito alto, na posição 42.

O Brasil ocupa a posição 89, na faixa dos países com desenvolvimento alto. No grupo de nações com resultado médio, estão Cabo Verde, na posição 131, São Tomé e Príncipe, em 141, Angola em 150 e Timor-Leste no lugar 155.

Guiné-Bissau ocupa a posição 179 e Moçambique a 183, ambos no grupo de economias com desenvolvimento humano considerado baixo. Todos os países de língua portuguesa caíram no ranking em comparação com 2021/22, com exceção de Moçambique, que subiu de 185 para 183. 

O Pnud destaca que os países ricos registram níveis recorde de desenvolvimento humano, no entanto, metade dos países mais pobres do mundo retrocederam, permanecendo abaixo do nível de progresso anterior à crise da Covid-19.

Conforme mencionado no relatório, quase 40% do comércio mundial de bens está concentrado em três ou menos países. Além disso, em 2021 a capitalização de mercado de cada uma das três maiores empresas de tecnologia do mundo ultrapassou o valor do Produto Interno Bruto, PIB, de mais de 90% dos países naquele ano.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que o mundo vive uma “era de polarização” que está afastando a possibilidade de cooperação em temas urgentes como resolução de conflitos e crise climática e tem um “impacto devastador no desenvolvimento sustentável”.

Ele disse que o relatório revela que a “melhor esperança para o futuro é combater a retórica divisionista e destacar objetivos comuns que unem a grande maioria das pessoas em todo o mundo”.

De acordo com o administrador do Pnud, Achim Steiner, o “fracasso da ação coletiva” para fazer avançar o combate à pobreza e às desigualdades “não só prejudica o desenvolvimento humano, mas também agrava a polarização e corrói ainda mais confiança nas pessoas e instituições em todo o mundo.”

O relatório argumenta que o avanço da ação coletiva internacional é dificultado por um emergente “paradoxo da democracia”. Embora nove em cada 10 pessoas em todo o mundo apoiem a democracia, mais da metade dos entrevistados expressaram apoio a líderes que poderiam prejudicar a ordem democrática.

Os autores citam ainda pesquisas que indicam que os países com governos populistas têm taxas de crescimento do Produto Interno Bruto, PIB, mais baixas. Quinze anos após a posse de um governo populista, o PIB per capita é considerado 10% menor do que seria em um cenário de governo não populista. 

O documento revela um “sentimento de impotência”, pois 68% das pessoas relatam que consideram ter pouca influência nas decisões do seu governo. Os autores argumentam que essa tendência, somada à polarização alimenta abordagens políticas “voltadas para dentro”.

Esse movimento é considerado preocupante, por estar em desacordo com a cooperação global necessária para abordar questões urgentes como a descarbonização das economias, uso indevido de tecnologias digitais e conflitos. 

“Apanhada no turbilhão antiglobalização, a cooperação internacional está sendo politizada”, afirma o levantamento.

O relatório sublinha que a “desglobalização” não é viável nem realista no mundo de hoje. O Pnud ressalta que nenhuma região está perto da autossuficiência, uma vez que todos dependem de importações de outras regiões de 25% ou mais de pelo menos um tipo importante de bens e serviços.

Segundo Steiner, “em um mundo marcado pela crescente polarização e divisão, negligenciar o investimento mútuo representa um grave ameaça ao nosso bem-estar e segurança. As abordagens protecionistas não podem resolver o problema complexo, desafios interligados que enfrentamos, incluindo a prevenção de pandemias, as alterações climáticas e a regulamentação”. 

O Pnud apela por uma “nova geração dos bens públicos globais”, composta por quatro eixos: o planetário, para estabilidade climática, o digital, para a equidade no acesso a novas tecnologias, o financeiro, para fortalecer a assistência humanitária e o desenvolvimento, bem como a redução da polarização e desinformação.