País
Crime de responsabilidade

Deputados pedem impeachment de Silvio Almeida por custeio de passagens para a ‘dama do tráfico’

O motivo é o fato da pasta ter pago passagens e diárias para Luciane Barbosa Farias, a “dama do tráfico” amazonense, para um evento sobre prevenção e combate à tortura nos dias 6 e7 de novembro deste ano.

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16 de novembro de 2023
Vinicius Palermo
Deputados pedem impeachment de Silvio Almeida por custeio de passagens para a ‘dama do tráfico’
Deputados querem o impeachment do ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida

Um grupo de 46 deputados federais de oposição ao governo, liderados por Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), apresentou na quinta-feira, 16, um pedido de impeachment do ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida. O motivo é o fato da pasta ter pago passagens e diárias para Luciane Barbosa Farias, a “dama do tráfico” amazonense, para um evento sobre prevenção e combate à tortura nos dias 6 e7 de novembro deste ano.

Luciane esteve reunida ao menos duas vezes com assessores do Ministério da Justiça e Segurança Pública de Flávio Dino, como representante da ONG Instituto Liberdade do Amazonas (ILA), presidida por ela. Ela é casada há onze anos com Clemilson dos Santos Farias, o Tio Patinhas, líder do Comando Vermelho no Estado. Desde que ele foi preso, para cumprir uma condenação de 31 anos, a esposa teria assumido o lugar dele na chefia dos negócios.

A própria Luciane também foi condenada pela Justiça e está recorrendo em liberdade. Além do Ministério da Justiça, ela esteve no Congresso Nacional e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A pasta de Silvio Almeida confirmou que pagou passagens e diárias para Luciane e para todos os demais integrantes do Encontro de Comitês e Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura. Segundo o Ministério, os Comitês têm autonomia para gerir os seus recursos e indicar os participantes do evento, sem que isso dependa de autorização do ministro.

O pedido de impeachment de Almeida acusa o ministro de “por o aparato estatal à disposição de indivíduo umbilicalmente ligado ao tráfico de ilícito drogas, aviltando a República” e o Ministério de “utilizar os recursos do Estado em prol para facilitar a penetração de associados criminosas no âmago do aparato público”.

Em outro trecho do documento, os deputados falam que há uma “cumplicidade no mínimo escandalosa das altas esferas da Administração federal com o crime organizado”. Eles pedem ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para dar início a um processo de impeachment que investigue Silvio Almeida por crime de responsabilidade. A reportagem procurou o ministro, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

Na quarta-feira, 15, a pasta divulgou uma nota afirmando que “nem o ministro, nem a secretária, nem qualquer pessoa do gabinete do ministro teve contato com a indicada (Luciane Barbosa Farias) ou mesmo interferiu na organização do evento que, insistimos, contou com mais de 70 pessoas do Brasil todo e que franqueou aos comitês estaduais a livre indicação de seus representantes”.

O Partido Novo denunciou à Comissão de Ética Pública da Presidência da República dois secretários do Ministério da Justiça e Segurança Pública que esconderam as reuniões que tiveram com Luciane Barbosa Farias.

O Secretário Nacional de Assuntos Legislativos, Elias Vaz, recebeu Luciane em seu gabinete no dia 19 de março. Quase um mês depois, em 2 de maio, a mulher se reuniu com o Secretário Nacional de Políticas Penais (Senappen), Rafael Velasco Brandani; com o Diretor de Inteligência Penitenciária, Sandro Abel Sousa Barradas; e com a ouvidora de Serviços Penais, Paula Cristina da Silva Godoy.

Vaz e Barradas não divulgam suas agendas desde o início do ano, apesar de estarem obrigados por lei a publicá-las. Velasco, por sua vez, costuma publicar seus compromissos num sistema da Controladoria-Geral da União (CGU), mas o nome de Luciane Farias foi omitido da agenda dele. Já Godoy não tem obrigação legal de informar publicamente com quem se reuniu.

A divulgação das reuniões por autoridades de alto escalão está prevista na Lei 12.813, de 16 de maio 2013, conhecida como a Lei de Conflito de Interesses.

“O que fica claro é a conduta dos denunciados em ocultar seus compromissos e fugir do escrutínio público de suas atividades à frente de Secretarias do Ministério Justiça e Segurança Pública”, escreveram os deputados federal Adriana Ventura (Novo-SP), Marcel Van Hattem (Novo-RS), e Gilson Marques (Novo-SC) à Comissão de Ética Pública, responsável por fiscalizar o descumprimento da Lei de Conflito de Interesses.

O partido também protocolou um projeto de lei na Câmara dos Deputados para considerar como ato de improbidade administrativa a não divulgação das agendas.

“A gestão pública precisa ser transparente para poder ser acompanhada e fiscalizada. Embora agentes públicos possam receber convidados para tratar de temas referentes à sua função, é preciso haver pertinência e justificativa para a agenda. Agora só é possível fazer a avaliação se houver transparência. Só com transparência pode haver responsabilização. É por isso que estamos propondo um PL para fortalecer essa garantia de acesso à informação”, disse Ventura.

Procurado, o Ministério da Justiça afirmou, em relação a Elias Vaz, que a Secretaria de Assuntos Legislativos é uma pasta “nova” e que a não divulgação se deve a um problema operacional que está sendo corrigido. Vaz, no entanto, foi nomeado há quase 11 meses.

Por sua vez, a Senappen, que responde por Velasco e Barradas, alegou que “algumas hipóteses são dispensadas de divulgação, incluindo aquelas cujo sigilo seja imprescindível à salvaguarda e à segurança da sociedade e do Estado”.