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Câncer de próstata

Rastreamento populacional não têm grande impacto na redução de mortalidade

Há anos, o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional do Câncer (Inca) não recomendam o rastreamento populacional

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11 de novembro de 2023
Vinicius Palermo
Rastreamento populacional não têm grande impacto na redução de mortalidade
Novembro Azul é a época de incentivar o combate ao câncer de próstata

Em meio às campanhas do Novembro Azul, período no qual se intensificam as recomendações para que homens cuidem de sua saúde e busquem o diagnóstico precoce do câncer de próstata, voltou a ganhar força uma discussão sobre a efetividade ou não do rastreamento populacional para a doença, ação na qual homens sem sintomas são orientados a realizar os exames de PSA (de sangue) e de toque retal com o objetivo de detectar eventuais tumores em fase inicial.

Há anos, o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional do Câncer (Inca) não recomendam o rastreamento populacional sob o argumento de que estudos científicos verificaram que programas de rastreamento não têm grande impacto na redução de mortalidade pela doença e podem causar danos à saúde do homem. Isso porque parte dos tumores diagnosticados podem ser do tipo indolente, que crescem lentamente e dificilmente se espalham para outros órgãos. Nesses casos, o paciente diagnosticado tem um risco aumentado de passar por um tratamento que seria desnecessário e que pode deixar sequelas como incontinência urinária e disfunção erétil.

Por outro lado, algumas sociedades médicas pontuam que esperar o homem manifestar algum sintoma da doença para orientá-lo a realizar os exames pode ser arriscado, dado que os cânceres de próstata em fase inicial geralmente não dão sinais claros. Assim, não fazer o rastreamento populacional poderia levar a diagnósticos de tumores em fase já avançada, quando as chances de cura são reduzidas e os tratamentos são mais sofridos.

Embora a controvérsia não seja nova, dois fatores fomentaram o debate nos últimos dias. No final de outubro, o Ministério da Saúde e o Inca publicaram uma nota técnica conjunta reafirmando que não recomendam o rastreamento, o que gerou reação de algumas sociedades médicas e especialistas.

Nesta semana, o debate foi parar no X (antigo Twitter) após a veiculação de uma esquete do canal Porta dos Fundos estrelada pelo ator Antônio Fagundes. O vídeo, que já tem mais de 1,4 milhão de visualizações, viralizou ao tratar de forma direta e bem-humorada a necessidade de os homens romperem o preconceito em relação ao exame de toque retal. “Quando é que você vai liberar esse cu aí?”, pergunta o artista na produção, ao se referir à importância do exame. O vídeo foi elogiado por espectadores pelo tom informal, mas criticado por alguns médicos que citaram justamente a recomendação do ministério e do Inca contrária à realização do rastreamento em todos os homens.

Mas afinal, diante das orientações dos órgãos de saúde, os homens não devem mais fazer os exames de rastreamento? Não é bem assim. Mesmo o ministério e o Inca, embora não recomendem campanhas para convocar indivíduos assintomáticos para a realização de PSA e toque retal, sugerem que homens, principalmente aqueles a partir dos 45 anos de idade, procurem um médico para uma avaliação individualizada e discussão sobre a realização ou não dos testes.

“Estudos mostram que os programas de rastreamento universal tiveram pouco impacto na (queda da) mortalidade, isso ainda é objeto de pesquisa, não temos absoluta segurança (de que ele traz mais benefícios do que riscos), então não é recomendado que seja feito de forma indiscriminada, como uma política pública. Mas todo homem, especialmente a partir dos 45 anos, deve se preocupar com sua saúde e procurar um médico que vai orientá-lo sobre os riscos e benefícios dos exames”, diz Roberto de Almeida Gil, diretor-geral do Inca.

Gil esclareceu que a busca por um especialista é ainda mais importante para homens que tenham algum fator de risco, como histórico de câncer de próstata na família, ou que apresentem algum sintoma suspeito. “Durante a consulta, por meio da conversa com o paciente, com os sintomas relatados e com o histórico familiar, as equipes médicas orientarão o paciente sobre a necessidade de realização de exames e poderão encaminhar para um médico urologista quando necessário”, afirmou.

Embora o câncer de próstata não apresente sintomas na maioria dos casos de doença em estágio inicial, alguns pacientes podem ter sinais como dificuldade para urinar, diminuição do jato de urina, necessidade de urinar mais vezes durante o dia ou à noite e sangue na urina ou no sêmen.

Nesses casos, a busca por um médico é obrigatória e o especialista provavelmente recomendará a realização dos exames de PSA e toque retal. A Sociedade Brasileira de Urologia tem entendimento semelhante ao do Ministério da Saúde. Para a entidade, não há, de fato, um consenso científico sobre a efetividade do rastreamento populacional em todos os homens sem sintomas.

Ela aconselha, no entanto, que todos os pacientes a partir dos 50 anos procurem um urologista para discutir individualmente a melhor conduta frente aos riscos e benefícios dos testes. Para pacientes com histórico familiar do tumor ou homens negros, que têm maior risco de desenvolver a doença, esse acompanhamento deve ser iniciado aos 45 anos.

“Reafirmamos que o diagnóstico precoce salva vidas. Um tumor detectado no estágio inicial tem mais de 90% de chance de cura, então, por mais que não haja recomendação de rastreio populacional, o homem precisa ser avisado sobre os benefícios e riscos dos exames para que ele avalie, junto ao médico, se acha que vale a pena fazer. E achamos que, se um homem chega a um posto de saúde, é orientado e manifesta a vontade de fazer os exames, isso deve ser oferecido a ele”, ressalta Alfredo Canalini, presidente da SBU.