Economia
Déficit zero

Governo depende do Congresso para endereçar questão fiscal

Dentro da meta de zerar o déficit das contas primárias no ano que vem, o governo depende da aprovação no Congresso de um pacote de medidas

Compartilhe:
25 de setembro de 2023
Vinicius Palermo
Governo depende do Congresso para endereçar questão fiscal
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse na segunda-feira, 25, que o acerto fiscal depende do Congresso Nacional, após citar diversas medidas que aguardam a apreciação do Legislativo – entre elas, matérias de recuperação das contas públicas e de estímulo ao crédito.

Dentro da meta de zerar o déficit das contas primárias no ano que vem, o governo depende da aprovação no Congresso de um pacote de medidas, como a tributação dos fundos exclusivos e offshore, para levantar receitas adicionais de R$ 168 bilhões.

Na segunda-feira, durante fórum de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Haddad reafirmou que, aritmeticamente, o novo marco fiscal faz o ajuste ao longo do tempo, porém o ponto é o tempo que esse ajuste pode levar. Nesse sentido, após considerar que as tentativas de ajuste historicamente recaíram sobre os mais pobres, Haddad apontou a necessidade de corrigir distorções tributárias.

“O problema é que o tempo do marco fiscal é um pouco maior do que a área econômica entende ser adequado. Antes do tempo de maturar por dinâmica própria, temos que ajudá-lo a performar melhor no curto prazo”, comentou o ministro.

Haddad rechaçou a visão, manifestada na época das eleições, de que a troca de governo faria mal à economia. “A alternância de poder fará melhor ao País se tivermos condições de endereçar esses temas, que não são exclusivos do Poder Executivo. Não depende só do Poder Executivo”, declarou.

Ao considerar como legítima a defesa por corte de despesas, Haddad pontuou que o governo criou uma secretaria dentro do ministério do Planejamento para mapear politicas públicas e repensar programas. Ele observou, porém, que, embora alguns deputados cobrem corte de gastos, o Congresso tem dificuldade de votar o projeto de lei que limita os supersalários do funcionalismo.

“Tem muita coisa que precisa ser feita logo. Estou convencido de que quanto mais zelo tivermos com essa questão fiscal, mais fácil a agenda desenvolvimentista vai andar”, disse Haddad no fórum da FGV.

Num momento em que citou ações do governo para evitar que o déficit primário chegasse a R$ 250 bilhões neste ano, como a reoneração dos combustíveis, Haddad lembrou que recebeu da administração anterior um orçamento com previsão de déficit de R$ 63 bilhões, mas que esta conta não considerava algumas despesas. “Feitas as contas, chegamos a um déficit de mais de R$ 200 bilhões, o que considero inviável”, disse o ministro.

Haddad, ao referir-se às eleições na Argentina no mês que vem, disse que o Mercosul está sob risco e um acordo do bloco com a União Europeia pode representar um “antídoto” contra a desorganização da região. “O Mercosul está em risco, sobretudo por eventos que podem acontecer no parceiro comercial”, disse.

Haddad mencionou o empenho do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em concretizar o acordo com os europeus, algo que pode, segundo ele, neutralizar ações de um novo governo no principal parceiro comercial da região, a Argentina, com potencial de desorganizar a região.

“Um acordo com a União Europeia seria um antídoto contra medidas que podem desorganizar a região”, disse o ministro.

Ao falar sobre o encontro, na última quarta-feira, dos presidentes do Brasil, Lula, e dos Estados Unidos, Joe Biden, Haddad pontuou ainda que terá encontro com representantes de multinacionais americanas. Segundo ele, um acordo com a maior economia do mundo será a coroação do aprofundamento das relações bilaterais.

O ministro disse também que se reunirá nos próximos dias com o senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), relator da Medida Provisória (MP) 1.117/23, que institui o Desenrola Brasil e caduca na próxima semana. “Eu tenho uma reunião com o relator para tratar deste assunto, mas é imprescindível a votação da medida, porque ela caduca antes do término do programa. Então nós vamos esclarecer ao relator que ela precisa ser votada. Já foi votada na Câmara e precisa ser aprovada no Senado”, comentou.

Nesta semana começa a segunda fase do Desenrola, na qual será feito o leilão reverso, de quem dá mais desconto e que tem maiores chances de reaver seu crédito.

“É uma semana do credor. Depois é que vamos abrir para o devedor concordar ou não com os descontos concedidos e fazer a contratação do parcelamento, se for o caso”, disse o ministro.

O ministro usou a sua participação em um fórum para chamar a atenção à corrosão da base de arrecadação do governo Ele citou estimativas que apontam uma erosão de base tributária de aproximadamente R$ 100 bilhões vinda de apenas duas medidas lançadas em 2017.

A primeira, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), foi a retirada do ICMS da base de cálculo de PIS/Cofins, que teve impacto de R$ 50 bilhões, ou 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), aos cofres do Tesouro numa conta conservadora.

A segunda medida foi a retirada de incentivos e benefícios de ICMS da base de cálculo dos tributos sobre o lucro pagos por empresas, esta responsável por retirar outros R$ 50 bilhões em arrecadação, conforme conta divulgada por Haddad no fórum da FGV.

O ministro apontou ainda desonerações representam 6% do Produto Interno Bruto (PIB), levando o País a uma situação “absurda” na qual incentivos com resultados sociais nulos ou muito pequenos são concedidos à despeito do déficit nas contas primárias.

“Se você combinar a erosão da base fiscal mais a ampliação das despesas, esta foi a realidade encontrada em dezembro, fora o populismo de última hora”, disse Haddad, referindo-se à desoneração dos combustíveis, feita pelo ex-presidente Jair Bolsonaro em ano eleitoral.

O ministro ressaltou que o governo depende do Congresso para endereçar a questão fiscal. Também lembrou que orçamento herdado da administração anterior, que previa déficit primário de R$ 63 bilhões, não incorporava despesas consideráveis, como o reforço do Bolsa Família, o aumento dos recursos do Fundeb e o piso da enfermagem.

Haddad pontuou que, com inclusão dessas despesas, o déficit orçamentário passou dos R$ 200 bilhões, mas houve um esforço do governo, com medidas como a reoneração dos combustíveis, para reduzir o tamanho do buraco. “O Orçamento do ano passado, depois de aprovado, previa mais de R$ 200 bilhões em déficit, o que não seria um bom caminho para a economia brasileira”, afirmou.