O Banco Central (BC) reduzirá a taxa básica de juros, a Selic, quando se sentir confortável para esse movimento, avaliou Affonso Celso Pastore, sócio-fundador da A.C Pastore & Associados e ex-presidente do Banco Central.
“Simplesmente estamos discutindo quando o Banco Central vai começar a baixar, quando omitimos o que segura juros em nível alto, que é a política fiscal expansionista”, declarou Pastore, durante o IX Seminário Anual de Política Monetária, promovido virtualmente pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Pastore criticou a postura do governo, dizendo achar esquisito que bata no presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, por estar fazendo seu trabalho. “Ele (BC) está fazendo o trabalho dele. Agora o juro, quando ele terminar de fazer o trabalho dele, vai estar muito alto”, disse Pastore. “Existe um erro crasso da política fiscal, não do Banco Central.”
Quanto ao momento de início do ciclo de corte de juros, Pastore afirmou que não gosta de fazer projeções, mas deixou seu palpite: “Não vou dizer quando vai começar, mas acho que começa em agosto”.
Para ele, em algum momento o BC vai cortar o juro, mas agora a inflação está alta e o mercado de trabalho vive um momento de pleno emprego. Quanto à questão de gastos de governo, o economista criticou o arcabouço fiscal em votação no Congresso, dizendo que leva a um aumento das despesas.
“Esse que está aí espera cobrir gastos com aumento de receita, essa é a expectativa”, resumiu.
Para Pastore, o arcabouço não eliminou, mas reduziu o risco de um evento extremo (chamado tecnicamente de risco de cauda) de descontrole nas contas públicas. Ele prevê que a taxa de juros no Brasil caia, mas se mantenha acima da dos Estados Unidos, o que atrairá capital.
Como não tem risco de cauda, o capital vem e mantém o real valorizado, estima Pastore. No entanto, a política monetária do Fed deve ter reflexos na economia dos Estados Unidos nos próximos meses, com riscos de recessão local, o que terá impactos também sobre a atividade econômica brasileira, que enfrentará por uma desaceleração em alguns meses.
“Campos Neto estará no Banco Central em 2024”, lembrou Pastore. “A pergunta é: a economia desacelera, o que o governo vai fazer? A gente vai assistir, no mínimo, no mínimo, a um acionamento de bancos públicos.”
Pastore estima que a taxa neutra de juros no Brasil ficaria mais alta nesse cenário. Segundo ele, o tema estará em discussão num horizonte de seis meses a um ano.
“Nenhum de nós consegue mudar a política econômica do governo americano, do Fed, do Banco Central do Brasil, do governo brasileiro”, frisou. “O estado da natureza agora está muito melhor do que vai estar daqui a seis meses a um ano. Eu vejo pela frente dificuldade no fronte da condução econômica.”
O ex-presidente do Banco Central admitiu ainda que reagiu “muito mal” à paralisação do ciclo de aumentos da taxa de juro norte-americana pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos).
O tamanho da indignação demonstrada por Pastore à decisão do Fed de interromper o ciclo de alta dos Fed Funds pôde ser medida pela intensidade da crítica que ele dirigiu ao presidente da autoridade monetária norte-americana, Jerome Powell, a quem chamou de “fraco”.
“O Powell foi fraco na condução do Fed. Se tivesse o Paul Volcker, na presidência do Fed, o juro teria subido”, disse Pastore ao se referir ao ex-presidente do Fed, morto aos 92 anos de idade em dezembro de 2019. Volcker se notabilizou por ter elevado fortemente os juros americanos após o segundo choque do petróleo, em 1979, o que levou países latino-americanos, como Brasil e México, à crise da dívida e consequentemente à moratória.
Pastore disse ainda acreditar que o Fed retomará a sua política de aumento de juro diante do aumento da inflação e de um mercado de trabalho que permanece aquecido.
Ainda sobre a política monetária norte-americana, o chefe do Centro de Estudos Monetário do FGV/Ibre, José Júlio Senna, também disse ter dificuldades para compreender a razão de o Fed não ter sinalizado com mais ênfase mais duas altas de juro pela frente. Por conta de uma inflação alta para os padrões norte-americanos e por conta de um mercado de trabalho aquecido, em pleno emprego, Senna disse achar que mais duas altas na taxa de juro nos Estados Unidos seriam razoáveis.
Para Senna, o Fed não terá como escapar de uma retomada das altas de seu juro básico ainda que isso leve a economia dos EUA à recessão, com impactos na economia global. “Acho difícil o Fed trazer inflação para meta sem causar recessão. Ele vai retomar altas de juro e o efeito recessivo aparecerá”, disse Senna.
O diretor do BTG Pactual, Eduardo Loyo, concordou com José Júlio Senna e completou que “a ideia de que o Fed reduzirá inflação de forma indolor é uma coisa mítica”. Segundo ele, é preciso sacrifício sim e o Federal Reserve terá que retomar alta de juro.