Mais de 258 milhões de pessoas, em 58 países, enfrentaram insegurança alimentar aguda no ano passado, revela um novo estudo. As principais razões foram conflitos, mudanças climáticas, efeitos da pandemia e a guerra na Ucrânia.
O Relatório Global sobre Crises Alimentares (em inglês) foi divulgado, na quarta-feira, por uma aliança de entidades humanitárias, incluindo a União Europeia e o Programa Mundial de Alimentos, PMA.
O estudo defende que a insegurança alimentar aguda causou mortes em sete países: Somália, Afeganistão, Burquina Fasso, Haiti, Nigéria, Sudão do Sul e Iêmen. As vítimas e pessoas carecendo de ajuda aumentaram pelo quarto ano consecutivo.
A situação crítica se deve à falta de alimentos adequados, que coloca em risco imediato a vida ou os meios de subsistência.
Para o secretário-geral, António Guterres, esta realidade revela de forma contundente o fracasso da humanidade em avançar em direção ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 2, que prevê acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e a melhoria da nutrição para todos.
O chefe da ONU ressaltou que o mundo está na direção errada, mas pediu ação coletiva e compromisso com a mudança para garantir o acesso de todos à alimentação e nutrição que são as necessidades humanas mais básicas.
O levantamento, que inclui países de língua portuguesa, destaca Angola e Moçambique entre as nove grandes crises alimentares que afetam os países da África Central e Austral.
Ambos aparecem na classificação por terem mais de 1 milhão de pessoas na Fase 3 ou acima dela, considerada de crise na Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar, IPC.
Moçambique concentra 3,15 milhões de pessoas vivendo em situação alimentar crítica, principalmente devido ao conflito ou insegurança. Já Angola registrou 1,58 milhão, sendo os extremos climáticos um dos principais motivos.
Já o Timor-Leste foi excluído da análise por causa lacunas de dados. O país da região Ásia e Pacífico foi apontado apenas uma vez como uma das principais crises alimentares.
Cabo Verde aparece entre as nações que pediram ajuda externa para alimentos e ou enfrentaram choque alimentar no ano passado. O arquipélago registrou uma inflação de 16,9%, fazendo parte das situações em que a alta de preços alimentares esteve acima de 10%, incluindo Afeganistão, Bangladesh, Burquina Fasso e Burundi.
Guiné-Bissau e Cabo Verde integram 13 grandes crises alimentares nos últimos cinco anos, juntamente com Congo, Cote d’Ivoire ou Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Libéria, Líbia, Nepal, Nicarágua, Ruanda, Senegal e Togo.
O Brasil é citado por ser um dos cinco países onde os preços de alimentos, fertilizantes, energia e fretes tiveram uma queda em meados de 2022 devido a uma série de fatores, mas permanecem bem acima dos níveis pré-pandemia.
Nesses contextos, a redução nas exportações de commodities da Rússia e da Ucrânia foi parcialmente compensada pelas exportações juntamente com a vizinha Argentina e Austrália, Reino Unido e Estados Unidos.
No Brasil, o desperdício de alimentos chegou a 13,4% entre refugiados e crianças migrantes menores de cinco anos, um nível que na América Latina e Caribe está abaixo de 5%.
Em nível global, o relatório destaca uma tendência preocupante de piora da insegurança alimentar, embora o aumento verificado no ano passado se deva, em parte, à análise de mais grupos populacionais e à gravidade do problema.
Perante as várias crises, o documento apela a uma mudança de paradigma para que mais recursos sejam gastos investindo em intervenções agrícolas que antecipem crises alimentares e tenham como alvo evitá-las.
Questões como conflitos, choques econômicos e condições climáticas extremas continuam cada vez mais interligados, sustentando-se umas às outras e com efeitos negativos na insegurança alimentar aguda e na nutrição.
A publicação destaca ainda que não há indicação de que esses fatores diminuirão em 2023.
Espera-se que a mudança climática leve a mais extremos, a economia seja sombria em níveis global e nacional e que persistam conflitos e insegurança.